sexta-feira, 23 de novembro de 2007

Mensalão do pão de queijo: Noblat conta tudo

Principais trechos da denúncia do Procurador-Geral


O início de tudo

Com o aprofundamento da investigação desenvolvida no âmbito do Inquérito n.º 2245 [o do mensalão do governo], percebeu-se que o modus operandi dos fatos criminosos ali apurados teve a sua origem no período da campanha para Governador do Estado de Minas Gerais no ano de 1998. Diante dessa constatação, o Inquérito n.º 2245 foi desmembrado, resultando na instauração do Inquérito n.º 2280, que passou a ter como objetivo desvendar os crimes perpetrados no ano de 1998 no contexto da campanha de reeleição do então Governador do Estado de Minas Gerais Eduardo Azeredo. Como de fato começou... No início do ano de 1996, as empresas [de propaganda] comandadas por Cristiano Paz e Ramon Hollerbach encontravam-se em dificuldades financeiras, razão pela qual Marcos Valério foi por eles incumbido de conseguir o ingresso de um novo sócio que viabilizasse a retomada do crescimento dos negócios.
(...)
Pois bem: incumbido por Cristiano Paz e Ramon Hollerbach, Marcos Valério identificou Clésio Andrade como o sócio perfeito para a continuidade das atividades das empresas.
Empresário bem sucedido e com vários contatos políticos, especialmente no Estado de Minas Gerais, ele teria condições de alavancar os negócios de Cristiano Paz e Ramon Hollerbach.
(...)
Assim, tem início a parceria que resultaria, já em 1998, no desvio de pelo menos três milhões e quinhentos mil reais dos cofres públicos do Estado de Minas Gerais para a campanha de reeleição de Eduardo Azeredo, tendo como candidato à Vice Clésio Andrade, e, anos mais tarde, nos fatos descritos na denúncia oferecida no Inquérito n.º 2245.

Os pilares do esquema
a) desvio de recursos públicos do Estado de Minas Gerais, diretamente ou tendo como fonte empresas estatais;
b) repasse de verbas de empresas privadas com interesses econômicos perante o Estado de Minas Gerais, notadamente empreiteiras e bancos, por intermédio da engrenagem ilícita arquitetada por Clésio Andrade, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Marcos Valério, em conjunto com o Banco Rural; e
c) utilização dos serviços profissionais e remunerados de lavagem de dinheiro operados por Clésio Andrade, Cristiano Paz, Ramon Hollerbach e Marcos Valério, em conjunto com o Banco Rural, para garantir uma aparência de legalidade às operações referidas anteriormente, inviabilizando a identificação da origem e natureza dos recursos.

A participação de Mares Guia

Walfrido dos Mares Guia era Vice-Governador do Estado de Minas Gerais, eleito em 1994, época em que foi o coordenador geral da campanha eleitoral. Na eleição de 1998, resolveu candidatar-se à Deputado Federal e figurou como um dos organizadores da campanha de Eduardo Azeredo, inclusive em seu aspecto financeiro. Foi ele, por exemplo, que formulou, ainda no início da campanha, o esboço contendo a estimativa de recursos que o processo eleitoral necessitaria. Recursos esses, diga-se de passagem, que foram supridos pelo esquema criminoso oferecido e executado por Clésio Andrade, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach. Também foi sua a estimativa de gastos para o segundo turno da campanha eleitoral de 1998, demonstrando que a sua atuação foi estável ao longo da disputa eleitoral. Ademais, tinha pleno conhecimento da engrenagem criminosa de financiamento da campanha, tanto que confirmou para Cláudio Mourão que a empresa de Marcos Valério poderia utilizar o contrato público mantido com o Estado de Minas Gerais como garantia de um dos empréstimos fraudulentos obtido junto ao Banco Rural. Walfrido dos Mares Guia também era um dos responsáveis por indicar as pessoas que receberiam os recursos da campanha, fruto dos crimes descritos.

De quem foi a idéia

A decisão de implantar o esquema coube aos integrantes da cúpula do Estado de Minas Gerais e da campanha pela reeleição: Eduardo Azeredo, Walfrido dos Mares Guia, Cláudio Mourão e Clésio Andrade. Os acertos financeiros e de metodologia foram estabelecidos por Clésio Andrade, Cláudio Mourão, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach.

Operação “abafa” Cláudio Mourão

Eduardo Azeredo indicou seu homem de confiança Cláudio Mourão para cuidar da parte financeira da eleição. Ele tinha, inclusive, uma procuração em nome de Eduardo Azeredo para administrar financeiramente a campanha. O problema é que a derrota eleitoral de Eduardo Azeredo deixou Cláudio Mourão com expressiva dívida que tinha sido contraída por sua empresa Locadora de Automóveis União Ltda, cujos sócios eram seus filhos. Com o agravamento da sua situação financeira, Cláudio Mourão rompeu com Eduardo Azeredo e resolveu cobrar a dívida, que, segundo ele, era de um milhão e quinhentos mil reais. Diante da pressão de Cláudio Mourão, que tinha sido peça chave no esquema da eleição de 1998, e, portanto, poderia incriminar gravemente Eduardo Azeredo e seus colaboradores da época, ele (Eduardo Azeredo) resolveu procurar os principais envolvidos nos crimes praticados em 1998 a fim de adotar providências para “acalmar” Cláudio Mourão, mediante o atendimento, pelo menos parcial, de suas exigências. A pressão materializou-se, mostrando que Cláudio Mourão representava um risco sério e iminente, quando ele (Cláudio Mourão), utilizando a procuração outorgada por Eduardo Azeredo para gerir financeiramente a campanha, emitiu um título em favor da empresa Locadora de Automóveis União Ltda contra Eduardo Azeredo e o protestou em cartório. A operação “abafa” é reveladora, pois reúne alguns dos principais personagens do esquema da campanha eleitoral de 1998: Eduardo Azeredo, Walfrido dos Mares Guia, Marcos Valério e Banco Rural. Todos estavam preocupados com a possibilidade de Cláudio Mourão, pressionado por dívidas, revelar as operações delituosas ocorridas em 1998 e os incriminar em fatos delituosos graves. Basta lembrar que nessa época, 2002, todos os fatos verificados na campanha de reeleição de Eduardo Azeredo eram ainda completamente desconhecidos dos órgãos de investigação. O risco era muito grande. Cláudio Mourão precisava ser neutralizado. Por solicitação de Eduardo Azeredo, a operação foi intermediada por Walfrido dos Mares Guia.

Os crimes de cada um

Eduardo Azeredo, Walfrido dos Mares Guia, Cláudio Mourão, Clésio Andrade, Marcos Valério, Cristiano Paz e Ramon Hollerbach – peculato (sete vezes) e lavagem de dinheiro (seis vezes)
Eduardo Guedes – peculato (duas vezes) e lavagem de dinheiro (seis vezes)
José Afonso Bicalho – lavagem de dinheiro (cinco vezes)
Fernando Moreira, Lauro Wilson, Renato Caporali, Sylvio Romero, Eduardo Mundim e Jair Alonso de Oliveira – lavagem de dinheiro (uma vez)

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