sexta-feira, 31 de agosto de 2007

Mensalão: posfácio

Folha - Como o sr. se sente após a publicação de trechos de uma conversa ao telefone sobre o resultado do julgamento?
Enrique Ricardo Lewandowski - Estou submetido a um profundo julgamento moral. Entendo agora o sentimento do jurisdicionado que bate às portas da Justiça pedindo uma reparação. O sofrimento moral não é só meu. É da minha mulher, da minha mãe, que tem 91 anos, meus filhos, meus irmãos e meus amigos.
Eu estou envolvido numa trama kafkiana. No primeiro ano de direito da USP, eu mando os meus alunos lerem dois livros: "1984", do George Orwell, e "O Processo", de Kafka. Olha que paradoxo. Eu sou uma pessoa extremamente sensível, preocupada com a preservação da privacidade das pessoas e com a possibilidade de alguém se enredar em um procedimento de natureza kafkiana.
Folha - No livro "O Processo", o personagem Joseph K. sofre um processo que ele não sabe o que é. A matéria de hoje fala sobre uma conversa telefônica que efetivamente existiu. Ela reflete a sua opinião sobre o resultado do julgamento? O sr. acha que os ministros se curvaram diante de uma pressão da imprensa?
Lewandowski - Não, os ministros são absolutamente independentes. Os debates foram públicos, duraram cinco dias. A nação brasileira viu o alto nível técnico deles. Não houve nenhuma interlocução espúria, escusa, de bastidores. Os ministros expuseram o seu ponto de vista de peito aberto. Eu apliquei nesse julgamento 15 anos de magistratura, sete anos de conhecimento do direito penal. Na questão da quadrilha, eu dei um voto calcado em bases profundamente técnicas.
Folha - O sr. já tinha externado essa dúvida naquela conversa com a ministra Cármen Lúcia, mas tinha dito que, salvo engano, não mudaria o seu entendimento.
Lewandowski - Em relação a Delúbio Soares, Silvio Pereira e outros, eu entendi que havia indícios na denúncia de quadrilha. Com relação aos outros, eu entendi que não havia. Entendi tecnicamente que havia indícios contra José Dirceu em relação à corrupção ativa.
Eu espero justiça da imprensa. Eu faço justiça todo dia aqui. Eu espero que a imprensa me faça justiça também.
Folha - Então qual foi o contexto da conversa?
Lewandowski - Foi um desabafo com o meu irmão Marcelo, que me ligou para prestar solidariedade e discordar de algumas posições, me cobrando, como cidadão, falando: 'poxa, Ricardo, como é que você vota assim.' Eu votei com absoluta independência como sempre fiz. Eu não tenho compromisso com ninguém. Não sou filiado a partido político.
O que eu senti é que o STF foi submetido a uma pressão violentíssima da mídia. Flashes espocando, jornalistas na porta da minha casa. O juiz precisa ter tranqüilidade para julgar, como o cirurgião quando faz uma cirurgia. Ele não pode sofrer esse assédio. Eu tenho aqui processos dificílimos, que envolvem a liberdade, a honra, o patrimônio das pessoas.
Folha - Até onde vai o direito à intimidade e onde começa o interesse público. Na troca de e-mails, trata-se da conversa de dois ministros do STF, dentro de uma sessão de julgamento, à qual a imprensa tinha acesso. A imprensa deveria ter tido acesso a isso, lido o teor e descartado? Ou deveria ser fechado e depois se reportava o resultado?
Lewandowski - Eu acho que a imprensa presta um papel relevantíssimo, absolutamente fundamental para a democracia. Sem imprensa livre, absolutamente sem peias, não existe estado democrático. Acho que poucas coisas podem estar submetidas a segredo de justiça. A imprensa deve ter a maior liberdade possível.
No caso da minha comunicação com a ministra Cármen Lúcia, esse é um instrumento de trabalho, interno. Houve dois tipos de vazamento. Um deles é a comunicação que os ministros fazem com a sua assessoria, e isso é comum. À medida que o julgamento vai evoluindo, você pede material sobre jurisprudência. A cabeça do juiz vai sendo feita, graças a Deus, ao longo do julgamento. O juiz não vem com a cabeça feita.
Em segundo lugar, nesse nosso intranet, é comum fazermos brincadeiras com os colegas, até para amenizar as sessões. Todos nós temos apelidos. Eu devo ter apelido também. Fazemos apreciações sobre os trabalhos dos advogados, expressamos dúvidas sobre pontos obscuros. Às vezes, já votamos e pedimos para o colega que vai votar em seguida levantar algum aspecto, para que a gente possa formar a convicção com a mais absoluta isenção.
[No telefonema no restaurante] eu estava com a minha esposa, com quem sou casado há 30 anos. Nunca vi o Kakay [citado na matéria]. Informar o vinho que eu tomei, o que eu comi... Amanhã a imprensa estará fuçando no meu lixo para saber que tipo de remédio estou tomando. Se isso acontecer, é um país onde eu não quero viver e onde não gostaria que os meus filhos vivessem, em que a invasão de privacidade chega a este nível.
Fizeram ilações estranhas em relação aos e-mails que eu troquei com a Cármen. O jantar era em homenagem ao Sepúlveda Pertence, uma grande liderança, um professor de todos nós. Também houve as especulações sobre mudança de voto.
Folha - Mas, ainda que sejam especulações, o sr. não as vocalizou?
Lewandowski - Foi na intimidade.
Folha - Mas o sr. pensa isso, por exemplo, que o julgamento era tão importante a ponto de suscitar um acordo?
Lewandowski - Não, não. Acho que o julgamento era importante a ponto de as pessoas refletirem, mudarem de posição. Acho que as pessoas estavam extraordinariamente submetidas à mídia. Conheço o Eros Grau há 30 anos na faculdade de direito. Ele é professor de direito econômico e eu, de direito do Estado. Tenho o maior apreço e a maior admiração por ele. Conheço a isenção dele. O que eu fiz na minha intimidade foi especular em relação a determinados pontos do julgamento, notadamente a questão da quadrilha, que o STF tem uma jurisprudência consolidada em determinado sentido, que a doutrina tem uma posição muito firme com relação à caracterização desse tipo penal.
Folha - O sr. acha que o STF contrariou a doutrina e a jurisprudência predominantes?
Lewandowski - Não, eu acho que o voto do ministro Joaquim Barbosa foi tão técnico, tão vertical, tão satisfativo, que a sustentação oral do procurador-geral da República foi tão contundente que acabou afastando os argumentos dos advogados. Portanto os ministros com a liberdade que tem, com relação a sua convicção pessoal, acharam que a jurisprudência não se aplicava no caso.
Folha - O que o sr. quis dizer ao afirmar que os ministros votaram com a faca no pescoço?
Lewandowski - Eu falei com relação a mim e falei com o meu irmão, na intimidade. Por isso, posso ter usado um termo tão apropriado. Eu me senti com a faca no pescoço.
Eu me mantive firme, convicto, dei um voto técnico na questão da quadrilha. Ele foi longo, extenso, invocando a Constituição, a lei, a doutrina e a jurisprudência. Com relação ao Delúbio, Silvio Pereira e outros, eu acatei a questão da quadrilha. Com relação à corrupção ativa do sr. José Dirceu, eu acatei. Com relação a lavagem de dinheiro, peculato, eu acatei tudo, ponto a ponto, e justifiquei o meu ponto de vista, para o Brasil todo, em público. Ninguém me telefonou, ninguém me pediu nada. Não conheço ninguém [dos denunciados].
Folha - Houve uma conversa na véspera, para dirimir algumas dúvidas. O sr. acha que havia uma dúvida maior em relação ao enquadramento do ex-ministro José Dirceu, já que o sr. disse que a tendência era "amaciar"?
Lewandowski - Primeiro, eu não sei se usei essa palavra 'amaciar'. Pode ser, sinceramente eu não me lembro. Mas eu acho que amaciar é no sentido de que, pela avaliação que eu tinha, não que nenhum ministro tenha antecipado o voto, pelo contexto probatório, pelo histórico jurisprudencial da Casa, pelas conversas informais que se têm, pela apreciação que se faz do caso, eu achei que determinados pontos da denúncia cairiam pela inconsistência. Prevaleceu a opinião soberana de cada ministro, convencido pela sustentação oral do procurador-geral e pelo belíssimo voto do ministro Joaquim Barbosa [relator].
Eu demonstrei a mais absoluta independência. Apesar de estar fragilizado pelo vazamento das minhas comunicações privadas, eu me mantive firme às minhas convicções.
Folha - O sr. acha que o resultado foi alterado pela divulgação das mensagens?
Lewandowski - Absolutamente não. Eu achei que o julgamento ficou mais tenso, os ministros votaram evidentemente com mais cuidado, justificaram as suas posições com mais detalhamento.
É do interesse da sociedade brasileira que nós não transformemos o julgamento do STF em um julgamento dos anos 30 de Moscou, da época stalinista, um mero chancelador das denúncias do procurador-geral ou do voto de um ou outro ministro ou mesmo da opinião da imprensa.
Hoje, a imprensa me critica porque fiquei isolado num voto em que tive convicção. Mas amanhã ela talvez vá precisar de um tribunal independente e que tenha pessoas, como eu e outros ministros, com a coragem de colocar as suas posições, mesmo que sejam antipáticas perante a opinião pública.
Se eu não puder fazer isso, por Deus do céu, eu prefiro ir embora. Nós precisamos de tranqüilidade para votar. Não podemos, a cada despacho, cada prisão que determinamos, cada habeas corpus que concedemos, não podemos ser questionados sobre o interesse que existe por trás daquela decisão. Não é possível esse tipo de ilação.
Folha - O sr. acha que o sistema brasileiro de nomeação de ministros suscita uma certa dúvida em relação à independência?
Lewandowski - Absolutamente não. A pessoa para chegar ao STF tem a sua vida vasculhada, devassada. Vocês acham que o presidente da República, o ministro da Justiça, vai correr o risco de indicar alguém que não tenha notável saber jurídico e reputação ilibada? vocês acham que a vida da gente não foi vasculhada? Que o Senado, que representa a nacionalidade, no crivo que faz dos ministros, não fez toda essa apreciação?
Imaginem vocês se eu não fosse vitalício hoje, como eu estaria pressionado por A, B, C ou D. Curiosamente antes de vir para cá, até defendi a tese de que os ministros deveriam ter mandato, como tem nas cortes constitucionais européias. Eu me sinto diante de uma extraordinária pressão, que é violentíssima. Se você não tiver uma garantia de vitaliciedade, sucumbe.
Eu estou consciente de que hoje estou apanhando muito da imprensa, porque dei um voto contrário à opinião pública, mas é preciso haver vozes dissonantes num tribunal como esse. Assim como existe a mais ampla liberdade de imprensa, e sou favorável a ela até o último momento, acho importante também que o Judiciário tenha a mais irrestrita possibilidade de julgar de forma absolutamente independente, porque não podemos fechar as portas e rasgar a Constituição.
Folha - No telefonema, o sr. afirma que é amigo do ministro indicado Carlos Alberto Direito e que seria ele, porque havia uma campanha aberta pelo nome dele. Isso já tinha sido um tema da conversa com a ministra Cármen. Esse processo teve alguma relação com o julgamento do mensalão, pela premência do prazo para ser nomeado?
Lewandowski - O ministro Direito, isso você pegou muito bem. Ele é um ministro exemplar. Eu até disse a Cármen que ele vai dignificar o STF. Ele tem todas as qualidades para ser um grande ministro. Eu digo que é uma honra, vai engrandecer o STF. Eu conheço o trabalho dele. Fui um dos primeiros a incentivá-lo a postular o cargo, porque somos colegas no TSE. Eu lhe disse que ele tem o perfil para ser ministro do STF, é um homem probo, de grande saber jurídico, grande experiência profissional.
Folha - O STF está dividido em grupos?
Lewandowski - Não, absolutamente não. Aqui não existem grupos. As votações revelam isso. Por vezes, o ministro Gilmar Mendes votou comigo, que poderia eventualmente ser de outro grupo. O ministro Eros também. Claro que há simpatias, maiores afinidades. Eu tenho mais amizade com uns. Eu fiz uma amizade belíssima, extraordinária com o Joaquim Barbosa, logo que entrei. Fiz uma amizade extremamente cordial com o ministro Carlos Britto, que é um gentleman, um poeta, um homem de uma sensibilidade extraordinária. A Cármen Lúcia foi minha colega de pós-graduação em SP. A ministra Ellen em conheço de muito tempo.
Folha - O sr. acha que o fato de o STF nunca ter condenado nenhuma autoridade faz com que essa pressão que o sr. enxerga se potencialize e crie um certo ceticismo quanto às decisões nas questões penais?
Lewandowski - A ministra Ellen esclareceu bem [no final do julgamento]. É muito recente a mudança na Constituição que permitiu ao STF abrir ações penais sem autorização do Congresso Nacional. Além disso, essas ações são complexas, distintas das ações cíveis, dos mandados de segurança. Nesse tipo de ação, em que está em jogo a liberdade, é preciso realmente fazer um exame muito cuidadoso da prova, testemunhal, documental, pericial.
Em segundo lugar, os processos que tramitam no STF envolvem muitos réus, que mesmo na primeira instância levariam anos para resolver. mas não tenham dúvida de que o STF vai cumprir o seu papel.
Folha - O sr. acha que é a corte adequada para o julgamento?
Lewandowski - Não, eu sou em princípio contra o foro privilegiado. Acho que, salvo em circunstâncias absolutamente excepcionais, como no caso das mais altas autoridades do país, acho que contraria o princípio do juiz natural e da igualdade entre os cidadãos. Uma dessas autoridades é o presidente da República. Também não acho que um juiz de tribunal superior possa ser julgado por juiz inferior, do qual reviu sentenças.
Tenho também a convicção de que certos crimes praticados antes da assunção dos mandatos dos parlamentares não podem ser julgados aqui no STF.
Folha - O ex-ministro José Dirceu está dando uma entrevista agora em São Paulo, na qual questiona o resultado do julgamento a partir da publicação dessas declarações e das anteriores. O sr. acha que tem alguma possibilidade de se arguir a nulidade do julgamento?
Lewandowski - Não. O julgamento foi público, foi fundamentado tecnicamente. Todo mundo colocou o seu ponto de vista, não há essa possibilidade.
Folha - Qual é a sua previsão para duração do processo?
Lewandowski - Ele é complexo. Vai levar alguns anos, mas acho que está em muito boas mãos. O ministro Joaquim Barbosa demonstrou absoluta firmeza, competência e sensibilidade na condução desse processo e acho que ele chegará a bom termo.
Folha - O ministro Eros Grau cogita a possibilidade de interpelação judicial do sr. e da ministra Cármen Lúcia sobre o teor daquela conversa.
Lewandowski - Eu lamento. Conheço o ministro Eros Grau e o admiro há longos anos. Tenho sempre manifestado que ele é um magistrado absolutamente isento e competente. Ele deve tomar as medidas que ele achar convenientes. Eu responderei com a maior tranqüilidade. Em nenhum momento eu coloquei a honorabilidade dele em xeque.
Folha - O sr. gostaria de colocar alguma questão?
Lewandowski - Estou profundamente magoado, atingido. Eu sinto a dor moral das pessoas que têm a sua privacidade, a sua intimidade exposta ao público, uma vida, uma carreira de dedicação ao direito e à justiça abalada a partir de ilações que se possam fazer relativamente a considerações que fiz no âmbito privado, com uma colega de trabalho e com o meu irmão, onde eu estava absolutamente indefeso, desguarnecido, enfim desprotegido.
A imprensa e os meios de comunicação não podem ser os únicos árbitros do tênue limite que separa o público e o privado. Nesse episódio da divulgação dos e-mails, talvez a imprensa pudesse ter aguardado um pouco mais o término do julgamento.
Eu estou sendo injustamente envolvido numa trama kafkiana. No primeiro ano de direito da USP, eu mando os meus alunos lerem dois livros: "1984", do George Orwell, e "O Processo", de Kafka. Olha que paradoxo. Eu sou uma pessoa extremamente sensível, preocupada com a preservação da privacidade das pessoas e com a possibilidade de alguém se enredar em um procedimento de natureza kafkiana.


quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Mensalão: epílogo

Ministra Ellen Gracie:


Senhores Ministros, Senhora Ministra, o Tribunal, neste momento, encerra a apreciação da denúncia oferecida pelo Senhor Procurador-Geral da República, com base no Inquérito 2.245. Ao proclamar o resultado dos trabalhos desenvolvidos por este plenário, nos últimos três dias da semana passada, ontem e hoje – no total, estivemos, nessas bancadas, mais de trinta horas -, desejo registrar que o Tribunal conclui esta primeira fase em prazo absolutamente compatível tanto com a dimensão do caso – que é sui generis, com quatro dezenas de acusados e extrema complexidade -, como também com as demais tarefas que correspondem ao cotidiano dos Senhores Ministros. Neste momento, não posso deixar de consignar – espero que os Colegas não me queiram mal por isso – que, no intervalo deste julgamento, fizeram-se distribuir 2.094 processos na Casa. E, mais importante que tudo, com absoluto e rigoroso respeito ao devido processo legal.

Esses resultados só se fazem possíveis na medida e graças à segura condução do processo, empreendida pelo eminente Relator, Ministro Joaquim Barbosa. Sua Excelência fez também por utilizar recursos modernos de informática que facilitaram muito o seu trabalho, e também o nosso. Os autos foram, em seus cerca de cinqüenta e um volumes e mais de mil apensos, da primeira à última página, inteiramente digitalizados. Assim, foi possível que todos os Ministros tivessem acesso às peças do processo. Foi possível também aos ilustres defensores dos quarenta acusados o acesso simultâneo a este mesmo processo.

Não fosse por isso, somente a vista sucessiva dos autos teria consumido, no mínimo, por baixo, vinte meses, para que cada um dos acusados pudesse se manifestar nos autos. Não teríamos, portanto, chegado ao estágio atual. O mesmo ganho de tempo será reproduzido na fase instrutória. Isso nos leva a crer que a utilização desses recursos, dessa tecnologia que serve à celeridade processual, deve prosseguir. Por isso mesmo, tivemos debates tão informados, neste Plenário, em todo o transcorrer das sessões de julgamento.

É importante constatar também, senhoras e senhores, no momento em que encerramos a fase de recebimento desta denúncia, o quanto são equivocadas algumas opiniões pouco informadas sobre a eficiência deste Tribunal no trato da matéria penal. Vossas Excelências já tomaram conhecimento dos dados levantados pela Presidência durante o mês de recesso, o mês de julho. Esses dados revelam que, a partir de 1988 – e essa era a afirmação equivocada com relação a esta Corte; esse era o corte de tempo feito -, até o momento atual – o ano de 2000 -, o Tribunal já recebeu 143 ações penais, não mais que isso, ao longo de todo esse período.

É importante revelar, porque nem todos o sabem, que o Tribunal só pôde apreciar efetivamente ações penais a partir da autorização que lhe vem da Emenda Constitucional nº 35, a qual tem data de 20 de dezembro de 2001. Portanto, se mora houvesse desta Corte, ela só se poderia contar a partir do ano de 2002. Sabem todos que, antes disso, a Casa não processava sem a autorização das Casas Legislativas; e esta autorização não era deferida.

É importante revelar também – e, creio, este é o dado mais interessante – que, nesta Casa, tramitam, hoje, não mais que cinqüenta ações penais, dentre as quais agora se inaugura mais uma – são cinqüenta e uma. De todas as ações penais em tramitação nesta Casa, as duas mais antigas contam com pouco mais de quatro anos de tramitação. Em uma delas, ao menos três anos foram gastos tão-somente para a ouvida de testemunhas de defesa.

Cerca de 50% dessas cinqüenta ações têm menos de seis meses de tramitação. Indago a Vossas Excelências se conhecem algum juízo criminal em situação tão confortável quanto à desta Corte em relação à tramitação das suas ações penais. O mesmo se há de dizer com relação aos inquéritos em andamento. De novo, certa de 50% deles têm menos de seis meses de tramitação.
Já quanto às petições criminais, que veiculam alguma informação de natureza criminal que ainda não se transformou em inquérito, o número é ainda maior: temos mais de 67% delas com menos de seis meses de tramitação.

Creio que tudo isso revela o intenso trabalho dos eminentes Relatores; revela as dificuldades processuais que temos de enfrentar; revela também o intenso labor feito perante esta Casa, tanto pela Procuradoria-Geral, na acusação, quanto pelos nobres advogados defensores dos acusados.

Sem dúvida nenhuma, tenho dificuldades em acreditar que alguma Corte Suprema, no mundo, se reúna, na sua composição plenária, para o recebimento de denúncia com essas minúcias, esse detalhe, esse esforço analítico desenvolvido aqui, apesar de termos a quantidade de trabalho que todos os Senhores bem conhecem.

Neste momento em que encerramos este julgamento considerado histórico por muitos, é importante se restabelecer a verdade sobre fatos que dizem respeito ao funcionamento desta Casa, especialmente ao seu funcionamento em matéria criminal. A Casa tem uma longa história. Ela se credencia, perante a nação, por um desempenho notável no decorrer do tempo. É importante que, vez ou outra, tenhamos voz para refletir a realidade do nosso trabalho.

Ministro Celso de Mello:

Senhora Presidente, na linha do que Vossa Excelência expõe, também é preciso revelar, àqueles que demonstram o conhecimento da nossa realidade constitucional, que Deputados Federais e Senadores da República só passaram a ter prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, a partir da Carta Federal de 1969, travestida de Emenda Constitucional nº 01, daquele mesmo ano. Até então, sob a égide das Constituições Republicanas de 1891, de 1934, de 1937, de 1946 e de 1967, até o advento da chamada Emenda nº 01, de outubro de 1969 - Carta Federal de 1969 -, os membros do Congresso Nacional não tinham essa prerrogativa de foro. Tanto que o Supremo Tribunal Federal se viu obrigado a formular um enunciado sumular: a Súmula nº 398, com este conteúdo: “O Supremo Tribunal Federal não é competente para processar e julgar, originariamente, Deputado ou Senador acusado de crime.”
Isso sobreveio com o advento da Carta Federal de 1969. Digo assim porque a maior clientela do Supremo Tribunal Federal na área penal situa-se exatamente no Congresso Nacional, em ambas as Casas Legislativas. Portanto, o Supremo Tribunal Federal somente passou a se defrontar com processos penais originários em relação aos membros do Congresso Nacional a partir de outubro de 1969.
Há que se registrar e observar, ainda, tal como bem salientado por Vossa Excelência, que, mesmo em relação aos congressistas, salvo por um pequeno intervalo de tempo, só se podia proceder contra eles em face de licença expressamente concedida pela Casa Legislativa respectiva. Essa licença jamais era dada. Tomei posse nesta Corte em agosto de 1989 e, enquanto vigorou esse regime de imunidade parlamentar formal, não constatei qualquer situação em que as Casas do Congresso houvessem concedido licença para que um procedimento penal - instaurado por iniciativa do Ministério Público, ou eventualmente nas hipóteses de querelas privadas -tivesse seqüência. Havia obstáculos constitucionais que impediam, na verdade, a formulação, por esta Corte, de qualquer juízo condenatório.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO – Senhora Presidente, creio que é de justiça consignar aqui o impecável e irretocável desempenho de Vossa Excelência no planejamento deste julgamento que se encerra, verdadeiramente histórico e timbrado por tantas dificuldades e tanta complexidade de ordem técnica. Todos somos testemunhas da extrema organização, por parte de Vossa Excelência, no que tange ao planejamento das nossas atividades e ao empenho pessoal para que tudo desse certo e acontecesse a tempo e a hora, para chegarmos a esta terça-feira com o julgamento da denúncia completamente encerrado. Cumprimento Vossa Excelência com toda a sinceridade.

Ministra Ellen Gracie (Presidente): Senhores Ministros, Senhora Ministra, está encerrada a sessão.

Direito impedido

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ao julgar na noite de hoje (28) o Recurso contra Expedição de Diploma (RCED 673), interposto em desfavor da senadora Rosalba Ciarlini Rosado (DEM-RN), declarou o ministro Carlos Alberto Menezes Direito incompatível para apresentar seu voto, por ter ele sido indicado, nesta manhã, à vaga do ministro aposentado do Supremo Tribunal Federal, Sepúlveda Pertence. Este fato impossibilita que o ministro apresente seu voto-vista sobre o caso. O recurso será analisado por seu substituto na Corte, o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Félix Fischer.

O julgamento do processo contra a senadora, eleita em 2006 pelo Democratas (DEM), no Rio Grande do Norte, seria retomado nesta terça-feira (28) com a leitura do voto-vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Na sessão plenária do dia 9 de agosto, o julgamento foi suspenso pelo pedido de vista do ministro Menezes Direito. Antes, três ministros votaram pela rejeição do recurso e dois ministros pela cassação da senadora, acusada de abuso de poder econômico.

O presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello, ao saudar o colega pela indicação ao STF, propôs ao Plenário que o ministro Carlos Alberto Direito não participasse do julgamento, pois "essa circunstância (indicação) acarreta o impedimento de Sua Excelência para atuar no caso, tendo em conta que se discute nesse processo o mandato de senador, um mandato ligado à Casa que apreciará o nome de Sua Excelência". "E temos, isso é do conhecimento geral, o envolvimento de segmentos do próprio Senado, considerados os partidos políticos, na Corte", destacou. Por isso, o ministro Marco Aurélio sugeriu que se aceitasse o impedimento para que o processo fosse encaminhado ao segundo suplente do Superior Tribunal de Justiça junto ao TSE, ministro Félix Fischer.

O ministro Cezar Peluso, vice-presidente da Corte, concordou com a sugestão e salientou que, "o que está em jogo, sobretudo, aqui, é o prestígio deste Tribunal. É uma situação que considero absolutamente inusitada, porque qualquer que seja a hipótese que se avente, a situação é absolutamente delicada. Qualquer que fosse a solução dada poderia suscitar alguma dúvida. As pessoas não devem ter dúvida da honorabilidade deste Tribunal". E completou: "Há sempre pessoas que, podem... assim, num excesso, num momento de tentação, imaginar uma coisa dessa. Acho que não há aqui apenas uma questão ética, há uma questão jurídica, porque nas circunstâncias atuais a questão de Sua Excelência é de quem poderia ser acusado de ser interessado em uma das partes do processo. O que corresponde àquela hipótese do artigo 135 do Código de Processo Civil em que se reputa fundada suspeição. Acho que o caso que o Tribunal pode reconhecer fundada suspeição por motivo superveniente... Por motivo extremamente honroso para Vossa Excelência".


Agência TSE

trava-língua haikku

fala
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fala
farfalha...

... onde a pedra encalha
medra a melhor
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Noel na Globo



Eu é que pergunto todo dia: com que roupa?

terça-feira, 28 de agosto de 2007

Mensalão: o batismo

Preciso registrar isso. Meu batismo na TV Justiça foi esse julgamento do mensalão. Quem acompanhou o julgamento pela emissora deve ter notado o comentarista barbudo que ora vos escreve. Cheguei lá há três semanas para prestar consultoria jurídica para o jornalismo da TV e acabei indo parar no programa Justiça em Ação, que transmite e analisa todas as sessões do Plenário do STF. Parece que isso é inédito em todo o mundo. O Supremo julga todas as semanas regularmente (quarta e quinta em Plenário, terça nas duas Turmas)... Na verdade julga diariamente, pois a maior parte das estatísticas decisórias é resultado de decisões individuais de cada ministro-relator. A jurisprudência da Casa já é vinculante há muito, mas principalmente depois que a lei processual autorizou expressamente os relatores a decidirem o mérito dos recursos com base nos precedentes. Mas isso é outra história, estou aqui pra contar sobre meu batizado. Foi esse mensalão de cinco dias, mais de trinta horas de sessão (e de estúdio), links, vts, lapadas, escaladas, pé, cabeça, lauda, espelho (ainda não sei o que é maquiagem), os monitores e os tps ausentes, complicado! Mas parece que deu certo. Parece mesmo, pois eu gostei. Sofri mais com as entradas ao vivo nos telejornais: batimentos cardíacos fora de controle versos palavras encadeadas em frases a formar o discurso que jorre e pare... e explique e comente e narre os juízos os raciocínios jurídicos legais constitucionais. Isso também é difícil, refiro-me ao Direito, exige um domínio intelectual e tanto, mas se permite entender. Seria possível explicar isso na televisão? Não duvidei que conseguiria fazer, mas confesso que fiquei espantado com um bom resultado em tão pouco tempo. Sem falsa modéstia, espero ter feito bem esse trabalho. E que trabalho! Fui batizado na TV pelo mensalão! O caso difícil enfrentado pelo Supremo de maior audiência de sua história. Não havia ainda a TV no julgamento do FGTS (planos econômicos), quando desaguou no STF a enxurrada de recursos, inaugurando a era das estatísticas processuais. Ali o Supremo debateu o tema do direito adquirido com o Ministro Moreira Alves ditando o tom. Houve mais recentemente o julgamento do editor anti-semita e também o do aborto terapêutico em caso de feto anencefálico (este não concluído), mas acho que nenhum destes recebeu tanta atenção quanto o caso do mensalão. As repercussões políticas falam por si. Bom, acho que tudo correu bem porque fui bem acolhido, a simpatia de todos me deixou bem a vontade. Especialmente ali na bancada do estúdio, tive a companhia mui gentil e agradável de Odete Rocha Masi para começar a fazer as transmissões ao vivo. E hoje, cerca de três semanas depois, já dividindo a bancada com Rafael Braga, ajudei a concluir a cobertura da TV Justiça sobre o caso Mensalão. Ufa. Obrigado aos "coleguinhas" pelo apoio. Quem sabe eu não resolva tirar as aspas? Forte abraço.

PS. Haverá fotos.

domingo, 26 de agosto de 2007

mensalão: reta final

Para o relator, sessão de amanhã será a mais difícil
"Sociedade está com as vistas voltadas para o julgamento", diz Joaquim Barbosa

ANDRÉA MICHAEL DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

O ministro do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, relator do voto no caso mensalão, disse que "não está interessado em pressão política" e acredita que a sessão mais difícil do julgamento será amanhã, quando a Corte começa a apreciar a suposta prática dos crimes de quadrilha, corrupção e lavagem de dinheiro na relação do grupo comandado pelo ex-ministro José Dirceu e a base aliada no Congresso."A parte mais trabalhosa, digamos assim, vai ser a de segunda-feira, [quando o plenário do STF vai apreciar] o item seis, porque é a parte a mais complexa, envolve um grande número de pessoas, partidos. É realmente a parte mais robusta da denúncia", afirmou Barbosa.Na denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, além de Dirceu, são acusados o petista José Genoino, os ex-dirigentes do partido Silvio Pereira e Delúbio Soares, além de políticos de PL (hoje PR), PTB e PMDB. Até agora, o Supremo avaliou só 33% das acusações que pesam contra os 40 denunciados."Muito cansado", como ele afirmou, Barbosa estava em sua casa em Brasília quando falou à Folha, por telefone.Sobre o andamento do julgamento de maior repercussão política da história do STF, disse: "Está dentro das previsões. Está indo tudo bem. As dificuldades naturais do caso estão sendo superados, a começar da complexidade". Classificou como complexidade o grande número de denunciados e a quantidade de crimes. "As imputações são inúmeras, se entrelaçam, uma pode influir na outra. Vários dos denunciados são acusados por vário crimes. Todos esses detalhes fazem um caso intrincado."Questionado sobre a força da pressão política sobre o voto dos ministros do STF, respondeu: "Não me interessa".Em seguida, relatou o que chamou de "aspecto inusitado" que notou sobre o julgamento. "Normalmente os julgamentos do Supremo, em questões, assim, momentosas, fazem com que o plenário fique lotado. O contraste que estou sentindo neste julgamento é que o plenário não está lotado, mas a sociedade está com as vistas voltadas para o julgamento." E completou: "É um grande momento cívico, de cidadania, uma espécie de sinergia entre a Corte, o Poder Judiciário, e a sociedade".Barbosa não comentou as mensagens dos ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia, que trocaram impressões sobre o julgamento, revelaram bastidores sobre a sucessão de Sepúlveda Pertence e criticaram colegas. "Não quero falar sobre isso, não vou botar lenha nessa fogueira."

Folha de São Paulo, 26 de agosto de 2007.

Pulsar



Pulsar (1975)
Augusto de Campos
música de Caetano Veloso

sábado, 25 de agosto de 2007

Mensalão: STF notícias

Sexta-feira, 24 de Agosto de 2007
21:10
- Sessões da 1ª e 2ª Turmas do STF estão suspensas na terça-feira (28)
20:55
- Resultado parcial: STF já recebeu a denúncia contra 19 acusados no esquema do mensalão
20:50
- Supremo recebe denúncia de seis pessoas quanto à imputação de crime de lavagem de dinheiro
20:45
- Ministro Carlos Ayres Britto diz que o STF está fazendo justiça
20:07
- Plantão da Secretaria de Comunicação do STF para este fim de semana
20:05
- "Denúncia não pode ser recebida com carimbo", diz ministro Gilmar Mendes em voto
19:28
- STF aceita denúncia de lavagem de dinheiro contra núcleos publicitário e financeiro do mensalão
19:22
- Encerrada sessão plenária desta sexta-feira
18:23
- STF reserva mais dois dias para julgar denúncia do mensalão
17:57
- Núcleo Marcos Valério e diretores do Banco Rural responderão por lavagem de dinheiro
16:40
- Plenário analisa item da denúncia do mensalão sobre lavagem de dinheiro
16:30
- Lavagem e corrupção: unanimidade dos ministros recebe denúncia contra Pizzolato, Marcos Valério e sócios
16:20
- STF acolhe denúncia contra Gushiken e exclui acusação de peculato contra José Dirceu
16:18
- Novela da Rádio Justiça se inspira no bolão de loteria que quase chegou aos tribunais
15:05
- Aceita denúncia contra Pizzolato, Marcos Valério e sócios por peculato
14:20
- Supremo retoma sessão de julgamento do inquérito do mensalão
14:00
- Resultado parcial da votação do inquérito do mensalão
13:30
- STF recebe denúncia de peculato contra deputado João Paulo Cunha e sócios da SMP&B
13:00
- Plenário recebe denúncia contra deputado João Paulo Cunha, por lavagem de dinheiro
12:50
- Recebida denúncia sobre corrupção contra João Paulo Cunha, Marcos Valério, Ramon Hollembach e Cristiano Paz
12:42
- Marcos Valério, Ramon Hollerbach e Cristiano Paz também responderão pelo crime de peculato
12:30
- Ministro Eros Grau comenta em voto papel da imprensa e independência do juiz
12:22
- Recebida denúncia contra o deputado João Paulo Cunha quanto ao crime de peculato
12:05
- STF recebe denúncia de lavagem de dinheiro contra deputado João Paulo Cunha (PT)
11:52
- Ministros recebem denúncia referente a desvio de recursos públicos
11:50
- Recebida denúncia de gestão fraudulenta contra os dirigentes do Banco Rural
11:10
- Procurador-geral diz que BC enviou documentos por determinação do relator
10:57
- Recebida por unanimidade denúncia quanto ao primeiro item analisado pelo Plenário
10:50
- Oito ministros já votaram pelo recebimento da denúncia por gestão fraudulenta de instituição financeira
10:35
- Novas datas para continuidade do julgamento deverão ser decididas pelo Plenário
10:31
- Mais dois ministros recebem a denúncia quanto ao primeiro item analisado
10:28
- Ministro Eros Grau adia cirurgia médica para participar de julgamento do mensalão
10:19
- Direto do Plenário: Começa o terceiro dia de julgamento da denúncia do mensalão

Mensalão: resultado da enquete

O Supremo vai começar a julgar o caso Mensalão. Converterá ou não o inquérito em ação penal. Isso significa:

  • Que os acusados, se forem considerados réus, ficarão inelegíveis.
    0 (0%)
  • Que não há eventual questão eleitoral no caso que possa atrair a competência do TSE.
    2 (33%)
  • Que ninguém poderá ser absolvido nessa etapa do processo.
    1 (16%)
  • Que o STF somente poderá processar os réus detentores do foro especial. 3 (50%)

A resposta certa está em negrito, pois não há mais prazo processual para processar na instância eleitoral nenhum dos acusados, mesmo que tenham admitido que o dinheiro sacado junto a instituições bancárias era para pagar dívidas de campanha, o popular caixa dois. São fatos alcançados pela prescrição.

Reconheço que a terceira tem um peguinha técnico. Dizer que ninguém poderá ser absolvido é formalmente correto, pois, para os acusados que eventualmente sejam excluídos da Denúncia não terá havido absolvição, mas simples rejeição da admissibilidade da acusação contra si, não há absolvição formal se não houver julgamento. Mas isso é formalismo, o fato é que, se o STF decidir não abrir a ação penal contra determinado indiciado, ele estará, de fato, absolvido da acusação.

Os três que votaram na última se equivocaram mesmo, pois a ação, assim como inquérito, pode ser processada integralmente no STF, que já decidiu que é competente para processar todos os acusados.

Evasão de privacidade

Era do grampo, escutas ocultas, lentes potentes, tocaias, campanas, tudo para fabricar diretamente do cotidiano as celebridades instantâneas. Big brothers, reality shows... Até morar na roça dá ibope, desde que as moradoras sejam loiras turbinadas para o gosto da audiência. É isso. A audiência tem o poder. A audiência não se contenta mais com a ficção, exige a realidade, jogos mortais, acidentes, tragédias, mas também alcovas, escândalos, recintos, extratos, contas, cartas, e-mails. Tudo parece dizer que o importante é aparecer, pois a audiência pode querer ver. Hoje, nada é mais espetacular que o cotidiano. Haverá sempre uma câmera ou um celular prontos para flagrar o acontecimento que vende notícia. Tablóides proliferam em cima do jogo da fama. Mas estes, os famosos, vivem da exposição, evadem sua privacidade profissionalmente. O que vale para eles, valerá para todos? A Constituição ainda fala em intimidade protegida, comunicação privada e dados albergados pelo sigilo (art. 5º, X e XII), regras de baixa densidade e eficácia nesta era do grampo em que vivemos. Certo. A experiência republicana requer transparência, o exercício do poder público em público (Bobbio). Mas chegaremos ao ponto de perder totalmente o direito ao segredo?

Mensalão: editorial

Colóquio na corte

Toda instituição republicana, até a mais augusta, pertence aos cidadãos, que só ganham com a transparência

PODERIA TER SIDO muito pior -e mesmo assim não haveria nada de incorreto. Os meandros do mensalão começavam a ser postos em debate no Supremo Tribunal Federal quando uma conversa eletrônica entre dois membros daquela corte de Justiça foi flagrada por lentes fotográficas.A ministra Cármen Lúcia trocava impressões com seu colega Ricardo Lewandowski, não só a respeito do teor das acusações em pauta, mas também do comportamento presumível de outro ministro, a quem, de modo mais jocoso do que sibilino, denominou de "Cupido". Não foram necessários longos esforços de hermenêutica para deduzir-se que se tratava de seu vizinho no plenário, o ministro Eros Grau.O incidente não teria, à primeira vista, dimensões para suscitar mais do que um pálido sorriso, como aqueles que pairam, por vezes, nos rostos da estatuária clássica. Humanos, demasiado humanos, também os juízes se articulam nos bastidores, trocam informações reservadas e lançam em segredo, sobre seus colegas, as farpas da suspeita.Mais que isso estava em jogo, todavia, e houve quem reagisse à divulgação do colóquio pelo jornal carioca "O Globo" de forma exacerbada. Ex-presidente do STF, o atual ministro da Defesa Nelson Jobim qualificou de "intromissão anticonstitucional" aquele flagrante fotográfico.Vão-se tornando comuns as situações em que, por força do progresso tecnológico, reduz-se de forma drástica o diâmetro da privacidade individual. Certamente renova-se, com isto, a discussão sobre quais as responsabilidades da imprensa quando se trata de divulgar aquilo que, tempos atrás, não havia meios de captar.É o interesse público que deve presidir o exame de cada caso específico. A conversa entre os dois ministros do STF incidia sobre assunto indiscutivelmente relevante. Tratava-se de um hipotético acordo entre Eros Grau e o governo Lula, em torno da nomeação de um novo membro daquela corte. Na interpretação do ministro Lewandowski, a tendência de Eros Grau para não acolher a denúncia contra os envolvidos no mensalão viria a corroborar essa hipótese.Seria ingênuo imaginar que o STF esteja imune ao jogo das considerações políticas; seria também abusivo considerar que, num caso de grande complexidade jurídica como o do mensalão, não possa haver decisões independentes e fundamentadas em favor de qualquer lado no debate.Nem a legitimidade das decisões do Supremo Tribunal Federal nem a dimensão política de todo julgamento desse tribunal tornam-se suscetíveis de reavaliação automática a partir desse episódio. Mas este ampliou, entretanto, os recursos à disposição da opinião pública -já beneficiada com a própria transmissão das sessões pela TV- para acompanhar as atitudes de seus membros. Toda instituição republicana, por mais augusta que seja, pertence ao conjunto dos cidadãos; e estes só têm a ganhar com a transparência.

Folha de São Paulo, 24 de agosto de 2007.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Concunhado é inelegível

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu hoje (21), por maioria, que a regra de inelegibilidade de cônjuges e parentes consangüíneos ou afins também alcança o concunhado. Com o relator, ministro Cezar Peluso, que respondeu Consulta (CTA 1427) nesse sentido, formulada pelo deputado federal Eunício Oliveira (PMDB-CE), votaram cinco ministros. O voto divergente foi pronunciado pelo presidente da Corte, ministro Marco Aurélio Mello.A regra de inelegibilidade consta do parágrafo 7º, do artigo 14, da Constituição Federal e da Lei de Inelegibilidades (Lei Complementar 64/90). Na Consulta, o deputado Eunício Oliveira apresenta ao TSE a seguinte hipótese: “A e B são cônjuges e são eleitos prefeito e vice, respectivamente. São reeleitos nessa mesma ordem. Faltando dois anos e seis meses para terminar o mandato, A, prefeito reeleito, renuncia, e B, vice-prefeita, sua cônjuge, sem nunca ter assumido ou substituído A, quer no primeiro, quer no segundo mandato, assume o cargo de prefeita para completá-lo". O deputado pergunta, então, se “é possível um cunhado de A, (casado com uma irmã sua), ser candidato a prefeito na eleição subseqüente?” Ou seja, se o cunhado do prefeito que renunciou e, portanto, concunhado da prefeita que assumiu, pode sucedê-la. O ministro relator respondeu negativamente ao questionamento. Competência do TSE O artigo 23, item XII, do Código Eleitoral estabelece que cabe ao TSE responder a consultas sobre matéria de Direito Eleitoral que lhe forem formuladas em tese, feitas por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político.

Fonte: TSE

Obs: Só muita ingenuidade para achar que o Deputado consulente fez o questionamento apenas "em tese", isto é, sem pensar em situação concreta do contexto político regional. Este é o problema da competência consultiva do TSE: responde em tese para perguntadores em concreto.

Mensalão: cronologia do inquérito

  • 30 de março de 2006

    O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, apresentou denúncia ao STF contra 40 pessoas supostamente envolvidas no esquema de mensalão. A lista inclui os ex-ministros José Dirceu (Casa Civil) e Luiz Gushiken (Secretaria de Comunicação do Governo), além de empresários, publicitários e parlamentares. Na denúncia, eles são acusados de formação de quadrilha, lavagem de dinheiro, evasão ilegal de divisas, corrupção ativa e passiva e peculato. De acordo com a investigação do procurador-geral, o esquema mensalão foi realizado por meio de uma organização criminosa dividida em três núcleos: o político-partidário, o publicitário e o financeiro. O inquérito havia sido aberto a pedido de Antonio Fernando em julho de 2005, época em que as investigações tiveram início. Em 2006, quando o procurador-geral convenceu-se de que os crimes realmente ocorreram, ele ofereceu a denúncia ao STF. O inquérito corre no STF porque alguns dos acusados têm prerrogativa de foro.


  • 11 de abril de 2006

    O relator do inquérito, ministro Joaquim Barbosa, determina a notificação de todos os 40 acusados para responder à denúncia num prazo de 15 dias, que passou a tramitar sem o segredo de justiça que havia sido decretado anteriormente. Informações obtidas por meio de quebra de sigilos bancário, fiscal ou telefônico continuaram mantidas em segredo de justiça, sendo acessadas somente pelos advogados das partes.


  • 11 de maio de 2006

    Para dar maior celeridade ao processo, o ministro Joaquim Barbosa anuncia a digitalização das quase 14 mil páginas que compunha o inquérito até então. “Ao definir essa estratégia operacional, o objetivo foi o de evitar tumulto na condução do inquérito, acionar os indiciados com maior celeridade e otimizar o atendimento aos inevitáveis requerimentos, pelos advogados dos envolvidos, de cópia parcial ou total dos autos”, disse Barbosa na ocasião. Iniciativa inédita no STF, ela também foi utilizada no inquérito que resultou da Operação Furação, que desarticulou máfia dos jogos ilegais no Rio .


  • 26 de maio de 2006

    Termina a digitalização do inquérito, que à época já estava com 40 mil páginas. Isso acelerou o processo de notificação dos 40 acusados, alguns residentes em Brasília e outros distribuídos entre oito estados. Nessa data, a maioria dos residentes em Brasília já havia sido notificada. Continuaram bloqueados dados sigilosos e solicitações de diligências do Ministério Público Federal, para garantir o efeito surpresa, necessário para o sucesso das investigações.


  • 31 de maio de 2006

    Plenário do STF decide que procuradores e advogados dos acusados de participar do esquema do mensalão poderão acessar os autos do processo por meio de uma senha a ser disponibilizada pelo Tribunal. A questão foi levada ao colegiado pelo relator do inquérito, ministro Joaquim Barbosa.

  • 4 de setembro de 2006

    O ministro Joaquim Barbosa anuncia que o inquérito do mensalão entra em nova etapa, já que a fase das notificações finais e das defesas prévias estava sendo finalizada. Nesta data, 38 dos 40 denunciados já haviam apresentado suas defesas. Barbosa anuncia também que consultará o procurador-geral da República sobre a possibilidade de desmembramento do inquérito.


  • 2 de outubro de 2006

    Oito acusados de ligação com o esquema do mensalão são eleitos para a Câmara dos Deputados: João Paulo Cunha (PT-SP), José Mentor (PT-SP), Vadão Gomes (PP-SP), Sandro Mabel (PL-GO), Pedro Henry (PP-MT), Paulo Rocha (PT-PA), Valdemar da Costa Neto (PL-ES) e José Genoino (PT-SP).


  • 6 de dezembro de 2006

    Por maioria de votos, o Plenário do STF decide que o Tribunal julgará todos os 40 denunciados no escândalo do mensalão.


  • Julho de 2007

    O STF marca para os dias 22, 23 e 24 de agosto o julgamento do inquérito do mensalão. Nesses dias, os ministros definirão se acolhem ou não a denúncia do procurador-geral da República, Antônio Fernando de Souza, contra os acusados de participar do esquema do mensalão. Na prática, os ministros analisarão a consistência e vão dizer se o processo deve ou não continuar. Caso a denúncia seja acolhida, os denunciados passarão a responder como réus em ação penal. Isso significa que as investigações sobre o caso serão aprofundadas para, posteriormente, o Plenário absolver ou condenar os acusados.

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Fidelidade à jurisprudência III

O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Eros Grau negou liminar pedida pelo PPS para afastar os parlamentares que trocaram o partido por outra legenda. O PPS pretendia que o STF também determinasse a convocação dos suplentes do partido para tomar posse nos cargos que ficariam vagos. Segundo Eros Grau, a jurisprudência do STF “é firme no sentido de que o princípio da infidelidade partidária não se aplica aos parlamentares já empossados”. Essa é a segunda decisão do STF que nega liminar para pedido idêntico de partido político. A primeira foi tomada no dia 9 de agosto pelo ministro Celso de Mello, ao analisar solicitação do PSDB. A decisão do ministro Eros data desta quarta-feira (15) e foi tomada no Mandado de Segurança (MS 26602) impetrado pelo PPS no início de maio, logo após o presidente da Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT-SP), negar o pedido de convocação dos suplentes para assumir o lugar dos parlamentares que trocaram de legenda. O PPS, o PSDB e o DEM (ex-PFL) fizeram o pedido com base em manifestação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que, por maioria de votos, entendeu que o mandato de deputado federal, estadual ou vereador pertence ao partido político pelo qual ele foi eleito. Além de afirmar que o pedido do PPS é contrário à jurisprudência do STF, o ministro Eros Grau argumentou que uma eventual reversão de decisão liminar que conduzisse os suplentes aos cargos declarados vagos causaria “transtornos na estrutura da organizacional da Câmara dos Deputados”. Segundo ele, “isso prejudicaria, em última análise, os trabalhos legislativos daquela Casa, necessários ao desenvolvimento do País”. O plenário do STF vai se pronunciar em definitivo sobre a questão quando julgar o mérito dos mandados de segurança do PPS, do PSDB e do DEM. Não há data prevista.


Fonte: STF

domingo, 19 de agosto de 2007

Mensalão: bastidores

STF faz debate prévio sobre denúncia do mensalão
KENNEDY ALENCAR

Folha Online

A presidente do STF (Supremo Tribunal Federal), ministra Ellen Gracie, tem discutido informalmente com os demais colegas uma eventual posição comum a respeito da denúncia do mensalão. Ellen já teve conversas informais com ministros do tribunal e já chamou alguns para encontros desse tipo na segunda e na terça. Há até a possibilidade de uma reunião de todos fora da agenda oficial.

A partir de quarta, o STF decidirá se aceitará dar início a uma ação penal contra os 40 denunciados, se excluirá alguns da acusação feita pelo procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, em março de 2006 ou se rejeitará a denúncia como um todo --esta uma possibilidade praticamente impossível, pois parte dos acusados já confessou delitos como prática de caixa dois.

A tendência do relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, é pedir a denúncia dos 40 acusados. O STF tem 11 ministros, mas, como Sepúlveda Pertence pediu aposentadoria recentemente, 10 integrantes do tribunal deverão apreciar nas próximas duas semanas a denúncia do mensalão --o mais grave escândalo de corrupção dos quase seis anos de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

A discussão prévia desejada por Ellen não é novidade. Ela já agiu assim em casos rumorosos, buscando afinar o discurso do Supremo. Oficialmente, Ellen e o tribunal dirão que essas conversas versam sobre aspectos formais da complexa decisão que será tomada.
No entanto, é mais do que isso. A troca prévia de avaliações entre ministros é comum na Suprema Corte americana. É uma forma de todos os ministros terem idéia da conduta de cada colega antes da hora da verdade.

No caso do mensalão, por exemplo, o relator da denúncia enviou aos seus colegas um resumo de sua posição. Dessa forma, pode receber comentários antes da apresentação oficial e até esclarecer dúvidas. Há rumores de que a ministra Carmem Lúcia deseja pedir vista, o que atrasaria a decisão sobre a denúncia.

Nos bastidores, há discordância no STF em relação à tendência de Joaquim Barbosa de aceitar da denúncia contra todos os 40 acusados. Barbosa, cujo pensamento jurídico é afinado com o dos integrantes do Ministério Público, crê que bastariam indícios para a acatar a denúncia, pois essa decisão não equivaleria a uma condenação antecipada. Na ação penal, os acusados poderão se defender e provar a eventual inocência.

No entanto, o ministro Cesar Peluzzo já chegou a dizer em conversas reservadas que o processo criminal não deve servir de palco para a produção de provas. Ou seja, o STF deve aceitar a denúncia se achar que existe consistência na acusação e não como forma de produzir provas por meio de mais investigação.

Ciente do simbolismo político da denúncia do mensalão e da repercussão na opinião pública, Ellen estimula a discussão prévia. Sua intenção é aparar arestas e dar alguma uniformidade à decisão, para tentar evitar eventual racha explícito do tribunal. Essa possibilidade, porém, não pode ser descartada, pois as conversas informais não são garantia de acerto a ser cumprido a partir de quarta. A avaliação da denúncia sobre o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, por exemplo, divide opiniões no STF. Na visão de ministros ditos mais formalistas, não haveria provas contra Dirceu, o que justificaria eventual exclusão da denúncia. Na avaliação de outros, os indícios contra o ex-ministro e a sua posição de grande influência no governo e no PT seriam suficientes para que respondesse a uma ação penal.

Na denúncia, Dirceu é apontado como o chefe de uma quadrilha que comprou apoio no Congresso. Acusado dos crimes de formação de quadrilha, peculato e corrupção ativa, o ex-ministro nega todos. Entre outros denunciados, estão o ex-tesoureiro Delúbio Soares, o publicitário Marcos Valério, o ex-presidente do PT José Genoino e o ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha.

Mensalão: a denúncia

Os fatos de que tratam a presente denúncia tornaram-se públicos a partir da divulgação pela imprensa de uma gravação de vídeo na qual o ex Chefe do DECAM/ECT, Maurício Marinho, solicitava e também recebia vantagem indevida para ilicitamente beneficiar um suposto empresário interessado em negociar com os Correios, mediante contratações espúrias, das quais resultariam vantagens econômicas tanto para o corruptor, quanto para o grupo de servidores e dirigentes da ECT que o Marinho dizia representar. Na negociação então estabelecida com o suposto empresário e seu acompanhante, Maurício Marinho expôs, com riqueza de detalhes, o esquema de corrupção de agentes públicos existente naquela empresa pública, conforme se depreende da leitura da reportagem divulgada na revista Veja, Edição de 18 de maio de 2005, com o título “O Homem Chave do PTB”. As investigações efetuadas pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito e também no âmbito do presente inquérito evidenciaram o loteamento político dos cargos públicos em troca de apoio às propostas do Governo, prática que representa um dos principais fatores do desvio e má aplicação de recursos públicos, com o objetivo de financiar campanhas milionárias nas eleições, além de proporcionar o enriquecimento ilícito de agentes públicos e políticos, empresários e lobistas que atuam nessa perniciosa engrenagem.
Assim começa o texto da Denúncia oferecida pelo Procurador-Geral da República contra 40 acusados no escândalo do Mensalão. O STF começa a analisar o pedido na próxima quarta-feira, dia 22. Decidirá apenas se recebe ou não a Denúncia, isto é, se transforma o Inquérito em ação penal e os indiciados em réus. Serão pelo menos três dias de sessão do Plenário para esse julgamento. Vamos acompanhar.

Crimes eleitorais: polícia e ladrão

Corrupção eleitoral: PGR denuncia Geraldo Pudim, Álvaro Lins e Anthony Garotinho. Eles são acusados de compra de votos de candidatos do concurso para investigador da Polícia Civil do Rio de Janeiro.

O procurador-geral da República, Antonio Fernando Souza, ofereceu denúncia ao Supremo Tribunal Federal contra o deputado federal Geraldo Pudim, o deputado estadual do Rio de Janeiro Álvaro Lins, o ex-governador Anthony Garotinho, o inspetor da Polícia Civil Mário de Carvalho (Marinho), o delegado da Polícia Civil Daniel Goulart e o técnico de informática Kuene Robson Pereira Alves. Os acusados montaram um esquema ilícito de captação de votos destinado a favorecer os então candidatos Geraldo Pudim e Álvaro Lins nas eleições de outubro de 2006, por meio do oferecimento de vantagens ao grupo denominado Excedentes PCERJ. Esse grupo era composto por candidatos habilitados na primeira fase do concurso público realizado em 2006 para o cargo de investigador da Polícia Civil do Rio de Janeiro que não foram classificados dentro do número de vagas previsto no edital e, por isso, não seriam convocados para as fases seguintes do processo seletivo. Segundo a denúncia, o esquema – idealizado por Álvaro Lins em 2005 – tinha por finalidade conseguir que cada excedente angariasse o maior número de votos para as campanhas eleitorais dele e de Geraldo Pudim, mediante a promessa de que seriam aproveitados nos cargos para os quais concorreram. Com o incentivo dos candidatos, os excedentes se organizaram e formaram uma comissão, presidida por Kuene Alves. Além de angariar votos, eles trabalharam gratuitamente como cabos eleitorais, realizando eventos em prol de Lins e Pudim, participando de carreatas e realizando o corpo a corpo com os eleitores. Os excedentes passaram também a se articular para que o governo do estado adotasse as medidas necessárias para viabilizar a promessa, mediante alteração do edital, de modo a permitir que eles cumprissem as etapas seguintes do concurso. Nessa fase, Geraldo Pudim utiliza seu acesso à então governadora Rosinha Matheus e o ex-governador Anthony Garotinho para permitir a alteração de uma regra do edital que possibilitaria a convocação dos excedentes.“Geraldo Pudim, Álvaro Lins e Garotinho atuaram nas diversas esferas da Administração estadual até que a alteração fosse publicada em 28 de setembro de 2006, às vésperas da eleição”, afirma o procurador-geral na denúncia. Coube a Daniel Goulart interceder junto às autoridades competentes para promover as mudanças. Ao final do processo, os candidatos fizeram comício anunciando a alteração. A compra de votos dos excedentes levou o Ministério Público Eleitoral no Rio de Janeiro a ajuizar uma ação de investigação judicial eleitoral (Aije) contra Álvaro Lins, para cassação de seu diploma de deputado estadual e imposição de multa pela prática de captação de sufrágio. Ao saber da ação, Álvaro determinou a Kuene que retirasse do site dos excedentes quaisquer imagens que o vinculassem ao grupo. Com isso, pretendeu induzir a Justiça Eleitoral a erro. Além disso, Álvaro Lins e Marinho, administrador financeiro de sua campanha, são acusados de fazer declaração falsa à Justiça Eleitoral, omitindo na prestação de contas ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE-RJ) despesas em valor superior a 200 mil reais. O procurador-geral da República pediu o desmembramento da denúncia ao Tribunal Regional Federal da 2ª Região, instância judicial competente para conhecer e julgar os crimes de autoria do deputado estadual Álvaro Lins.

Denunciados:

- Álvaro Lins dos Santos: compra de voto (art. 299 do Código Eleitoral), fraude processual (artigo 347 do Código Penal) e declaração falsa à Justiça Eleitoral (artigo 350 do Código Eleitoral)

- Geraldo Roberto Siqueira de Souza: compra de voto

- Anthony Willian Garotinho Matheus de Oliveira: compra de voto

- Mário Franklin Leite Mustrange de Carvalho: compra de voto e declaração falsa à Justiça Eleitoral.

- Daniel Goulart: compra de voto

- Kuene Robson Pereira Alves: compra de voto, fraude processual

Fonte: Ministério Público Federal

Obs. A notícia foi veiculada no site do próprio MPF, mas comete uma imprecisão quando "traduz" o art. 299 do Código Eleitoral como compra de voto. O ilícito eleitoral da captação ilícita de sufrágio prevista no art. 41-A da Lei das Eleições (9.504/97) é que costumeiramente é traduzido por compra de voto. Se provada, pode resultar na cassação do registro de candidatura ou do diploma (se já expedido) do acusado, mas não gera inelegibilidade. O 299 do CE é conhecido como o crime de corrupção eleitoral, gera pena de até 4 anos de reclusão e multa e, se a sentença que a aplicou transitar em julgado, o condenado fica inelegível durante o cumprimento da pena.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

José Paulo Sepúlveda Pertence

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, em pé, aplaudiu o Ministro José Paulo Sepúlveda Pertence, que hoje, 16 de agosto de 2007, despediu-se da Corte. Antecipou-se à compulsória. Cumpriu a promessa tantas vezes declarada de sair antes que fosse saído. Há exatos três meses, comemorou a marca da maioridade no Tribunal, 18 anos. Era o decano desde a saída do Ministro Sanches, se não me engano. Exerceu o decanato com a prudência de sempre, mas ganhou uma nova aura (hoje, o Advogado-Geral da União lhe pediu a benção), deixou a barba e, com a tranquilidade de quem vota por último, lecionou a jurisdição constitucional (embora adorasse citar a frase de um colega do passado: "Aqui neste Plenário ninguém ensina nada a ninguém"). Os colegas, ministros e ministras, acostumaram-se a fazer cessar debates calorosos e barulhentos para ouví-lo, em silêncio, no meio de uma votação. Hoje, emocionado, Pertence falou de saudade ao agradecer as homenagens. Emocionou a todos. E todos ficaram de pé e aplaudimos orgulhos.

quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Fidel, pero no mucho

O que mais chamou a atenção no projeto aprovado ontem pela Câmara dos Deputados foi a brecha de 30 dias para que qualquer filiado a partido político possa trocar de legenda sem sofrer sanção punitiva alguma. É uma janela que se abrirá a cada três anos, no mês de setembro do ano anterior à realização de eleições. Com isso, conjuga-se a necessidade de pelo menos um ano de filiação dentro do mesmo partido para garantir elegibilidade para os candidatos já prevista na lei eleitoral com a pressão social que não aprova o fisiológico troca-troca partidário praticado à luz do dia pelos políticos. Fidelidade, pero no mucho, o por lo minos hasta la pelea seguiente.
Os políticos além do mais promoveram desde já sua anistia, ao incluir no projeto a garantia de que aqueles que já trocaram de partido devem conservar seus mandatos. Há mais. O projeto aprovado ontem também limita a atuação do TSE, ao declarar que as decisões emanadas daquela Corte somente produzirão efeitos futuros (é mesmo viva na memória dos políticos a lembrança da verticalização e de outras decisões interpretativas da superior instância eleitoral).

Sobre as sanções punitivas impostas ao mandatário fujão - que sair do partido que o elegeu sem usar a janela aberta pra isso - o projeto estabelece prazo de quinze dias para que o partido abandonado peticione à Justiça Eleitoral exigindo a perda de mandato e a declaração de inelegibilidade do cujo, garantindo-se a este o contraditório e a ampla defesa. Defesa que poderá alegar, por exemplo que a fuga destina-se à fundação de outro partido, ou que ocorrera mudança ideológica ou programática no seio do partido que impediriam a continuidade da filiação, etc. Notem que há bastante espaço para argumentação.
Mas o que foi aprovado ontem era apenas o texto do substitutivo do deputado Mendes Ribeiro Filho (PMDB-RS) ao Projeto de Lei Complementar 35/07, do deputado Luciano Castro (PR-RR). Neste exato momento, quarta-feira, 22:ooh a Câmara vota os diversos destaques a esse texto. Ainda não temos a fumaça branca que sairá das cinzas da fogueira da reforma política acesa no Congresso.
A matéria depois seguirá pra o Senado.

terça-feira, 14 de agosto de 2007

Fidelidade partidária: a reforma continua

O assunto rende. Primeiro foi a consulta do então PFL, que queria saber se o deputado que troca de partido depois da eleição fica sem o mandato. O TSE disse que sim, que o mandato é do partido que lhe ofereceu legenda para concorrer. Depois dessa houve outras consultas ao Tribunal que a cada nova resposta vai promovendo uma verdadeira reforma política pela via jurisdicional, já que na via ordinária (legislativa) a "mãe de todas as reformas" não avançou. Já anunciamos aqui n'APonte que o TSE está prestes a responder outra consulta sobre fidelidade partidária que, se for na mesma direção das anteriores, deixará muito mais gente encrencada, pois estenderá para os chamados cargos majoritários o princípio da fidelidade aplicado nas eleições proporcionais. Bem, o site do TSE acaba de divulgar a entrada de um novo pedido de consulta (leia o texto abaixo). É isso aí, na Justiça Eleitoral a reforma política vai de vento em popa.

O deputado federal Celso Russomanno (PP-SP) protocolou duas Consultas (CTA 439 e CTA 1440) perante o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), com dúvidas sobre mudança de legenda e fidelidade partidária. O relator é o ministro Caputo Bastos. As perguntas, em tese, são as seguintes:

  • 1) "O candidato a cargo proporcional que, eleito, pedir transferência para outra legenda da mesma coligação pode conservar seu mandato?"
  • 2) "O candidato que atingir sozinho o quociente eleitoral e, após eleito, pedir cancelamento de filiação de partido ou transferência para outra legenda, pode conservar seu mandato?"
De acordo com o artigo 23, inciso XII, do Código Eleitoral, cabe ao TSE responder às consultas sobre matéria eleitoral, feitas em tese por autoridade com jurisdição federal ou órgão nacional de partido político. A consulta não tem caráter vinculante, mas pode servir de suporte para as razões do julgador.

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

Poema enjoadinho

Filhos... Filhos?

Melhor não tê-los!

Mas se não os temos

Como sabê-lo?

Se não os temos

Que de consulta

Quanto silêncio

Como os queremos!

Banho de mar

Diz que é um porrete...

Cônjuge voa

Transpõe o espaço

Engole água

Fica salgada

Se iodifica

Depois, que boa

Que morenaço

Que a esposa fica!

Resultado: filho

E então começa

A aporrinhação:

Cocô está branco

Cocô está preto

Bebe amoníaco

Comeu botão.

Filhos? Filhos

Melhor não tê-los

Noites de insônia

Cãs prematuras

Prantos convulsos

Meu Deus, salvai-o!

Filhos são o demo

Melhor não tê-los...

Mas se não os temos

Como sabê-los?

Como saber

Que macieza

Nos seus cabelos

Que cheiro morno

Na sua carne

Que gosto doce

Na sua boca!

Chupam gilete

Bebem xampu

Ateiam fogo

No quarteirão

Porém, que coisa

Que coisa louca

Que coisa linda

Que os filhos são!


Vinícius de Morais

sábado, 11 de agosto de 2007

O Maranhão do Sul, a Veja e os preconceitos

Não costumo ler a revista Veja. O periódico perdeu há muito tempo a isenção e o zelo jornalístico para o afã ideológico, condenatório, difamatório etc. Mas, a edição desta semana trouxe, na coluna de Roberto Pompeu de Toledo, um libelo acusatório contra a criação dos novos estados, em especial, o estado do Maranhão do Sul. Tenho certeza, pelo que li, que o jornalista não se deu o trabalho de investigar com cuidado a pretensão dos sulmaranhenses - como eu - que há bastante tempo lutam pela emancipação.
O texto de Veja foi respondido pelo jornalista imperatrizense Edmilson Sanches e publicado no blog do Maranhão do Sul. Reproduzo aqui o artigo na esperança de que possa animar mais discussões e, quem sabe, quebrar a monótona corrente contrária que só consegue enxergar o próprio umbigo opinativo e desinformado.

O MARANHÃO DO SUL NA “VEJA”, por EDMILSON SANCHES


Quando o assunto é redivisão territorial do Brasil, as pessoas que são contra sacam logo do bolso dois únicos argumentos: 1) vai aumentar a roubalheira, a corrupção; e 2) o País não tem dinheiro para pagar a sua parte da conta (construção, instalações, equipamentos e manutenção de órgãos governamentais e remuneração de servidores).Sou defensor da redivisão, mas não é isso o que me leva a concluir o quanto esses argumentos são frágeis, ou, no mínimo, apressados.


Em relação à corrupção e roubalheira em novos estados, vale lembrar que elas têm a idade do ser humano, que sempre quer mais, mesmo quando se encontra no Paraíso. Se o volume de roubalheira e corrupção, calculado em reais ou em dólares, fosse vinculado à redução das endodivisões (redivisão dos Estados), São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília sequer existiriam, ou tornariam ao estado de natureza. Neste país se rouba do povo desde sua descoberta -- basta citar os quase R$ 700 bilhões em corrupção e desperdício levantados em reportagens do jornal “O Dia” (RJ) em 2002.


Quanto à inexistência de recursos para implantação dos novos estados, diga-se que grande parte do dinheiro que a União investiria (é isso mesmo: investimento, não gasto) retornaria aos cofres do Tesouro Nacional. São altos os impostos incidentes sobre os materiais de construção (perto de 40% no cimento, na tinta e no vaso sanitário e 37% no tijolo). Em uma casa popular de R$ 45 mil os impostos “comem” R$ 22.275,00. E mais impostos sobre os móveis, as instalações e até o material de expediente e, em especial, sobre a folha de pagamento dos funcionários. Some-se a isso o custo do consumo, os tributos embutidos nos preços dos bens, produtos e serviços pagos com a massa salarial e outros ganhos -- impostos que vão de 18% na carne e no feijão, 40,5% no açúcar, a até 56% na cerveja e 83% no litro de cachaça. Portanto, vale repetir, se o Governo Federal investir R$ 1,9 bilhão em cada novo estado, ele teria esse valor de volta logo logo, e com “juros”, pois a nova dinâmica econômica que se desenvolveria na nova unidade federativa aumentaria o bolo dos impostos para os cofres públicos, sem falar nos ganhos indiretos, que viriam com a redução de gastos em assistência social, saúde, bolsas-issos e vales-aquilo, já que grande parte da população ficaria ao abrigo de atividades produtivas (assalariados, autônomos, empresários e empreendedores, além de parte no Serviço Público).


Economistas, sociólogos e outros pesquisadores e estudiosos têm um campo desafiador nesse assunto: o quanto retorna, para a União, do dinheiro investido na instalação de um novo Estado. Como exemplo, cite-se o economista Roberto Limeira (raro caso de razão e paixão na pesquisa e estudos sobre o tema), que mostra por A + B, ou melhor, com todos os números: menos de dois e meio por cento (R$ 12 bilhões) do meio trilhão de reais do PAC, aplicados na criação de seis estados (Araguaia, Carajás, Gurguéia, Maranhão do Sul, São Francisco e Tapajós), geraria nessa área (incluindo-se o estado do Tocantins) um milhão de empregos e riqueza (PIB) de R$ 60 bilhões (atualmente, já são gerados R$ 40 bilhões). Somente com os impostos e divisas de exportação, em apenas dois anos a União teria o retorno de todo o investimento feito, sem falar nos ganhos sociais, políticos, de auto-estima, de consolidação do território nacional e a repercussão econômica e social nos demais estados, sobretudo os do Sul-Sudeste, que venderiam mais para os novos “irmãos” e “desincharia” parte de sua população, com a volta de muitos brasileiros para suas origens nortistas e nordestinas.




Geopoliticamente, dividir não é fragmentar, mas consolidar. Se a sede de dinheiro e poder, se os sem-moral e os sem-vergonha da política se aproveitam do sonho da redivisão territorial para cometer seus crimes, onde está a culpa: no sonho ou no vagabundo político que sordidamente se assenhoreia dele? Ora!... Contra a corrupção (e outros crimes) devem agir Justiça, Polícia, Ministério Público... e a cidadania vigilante. Se essas estruturas não são eficazes a ponto de prender esses políticos bandidos, reaver o dinheiro e conter a sangria desatada que vitima o povo, então é bom diagnosticar as razões da ineficácia, receitar o remédio e controlar sua administração.


Dividir mais para administrar melhor tem sido tendência e realidade no mundo inteiro. Só os que não se dedicam um pouco mais ao estudo, acompanhamento e análise podem se assentar em bases tão pouco sólidas quanto as alegações de falta de dinheiro e excesso de corrupção como fatores inibidores da redivisão territorial.Nem o nosso planeta agüentou ser uma terra só. Saiu da condição de Pangéia, dividiu-se em dois supercontinentes e, no momento, são seis continentes. Até o começo do século 20 existiam pouco mais de 70 países. Agora, são quase duzentos. O que a Geologia começou, a Geografia confirmou: dividir faz bem -- e a Religião e a Filosofia ratificam. Divisão não é o mesmo que apropriação, corrupção. A redivisão territorial é a mais rápida e mais segura forma de promoção do desenvolvimento, de inclusão social. Com roubos e tudo.


A França, país quase do tamanho da Bahia, tem hoje 96 estados (départements), mais quatro além-mar e mais de 36 mil municípios (comunas). Quase 16 vezes maior do que o território francês, o Brasil existe com seus 26 estados e um distrito federal e menos de 5.700 municípios. Os Estados Unidos têm 51 unidades federativas cerca de 30 mil cidades. A Alemanha, com 356 mil km2 (quase o tamanho do Maranhão), tem 16 estados e mais de 12 mil cidades. A Espanha, com 505 mil km2 (bem menor que Minas Gerais), tem 50 estados (províncias) e oito mil cidades, total este semelhante ao da Itália, que é bem menor do que o Goiás. Do “A” do Afeganistão ao “Z” do Zimbábue, a correlação entre área territorial e quantidade de estados (ou similares) encontra no Brasil o país de mais injusto desequilíbrio, especialmente quando a isso se juntam as desigualdades socioeconômicas.

A revista "Veja", que trouxe em 15/08/2007, um texto do paulista e paulistano Roberto Pompeu de Toledo (“O Maranhão do Sul na Wikipédia”), talvez não abrigue réplicas em igual espaço -- é a força da “ditadura” e do monólogo dos veículos de comunicação bem sucedidos, que impõem, quase sem reserva, o poder de sua mensagem para o resto do país e para leitores nos quatro cantos do mundo, ouvindo quase nada a população, mesmo quando o assunto tem importância vital sobre o presente e futuro dela.O articulista Toledo talvez não saiba que a luta pela redivisão do lado sul do Maranhão tem mais de 180 anos. Que nossas riquezas naturais e culturais, a capacidade desbravadora e empreendedora de brasileiros de todo o país e de estrangeiros de todos os continentes fizeram e ainda vão transformar esta região em referência de progresso. O “estado de espírito” transmuta-se para “espírito de estado”. Além de estarem incorretas as referências do artigo do sr. Toledo, elas pecam ao afirmar que o Estado do Maranhão do Sul, quando criado, “irá para a rabeira [sic]”. Por que, sr. Toledo, o Tocantins e o Mato Grosso do Sul não ficaram nessa “rabeira”? Pois saiba que a parte sul do Maranhão tem riquezas naturais, geografia estratégica e outras vantagens comparativas e competitivas. O que falta -- e disso o Brasil é cheio -- é decisão política para promover o desenvolvimento regional com envolvimento do capital humano intelectual e social aqui formado ou que para aqui se transferiu.Falar de pólos agrograneleiros e agroenergéticos, recursos minerais e florestais, pecuária e indústria, comércio e agricultura, infra-estruturas etc. é necessário, mas, aqui, seria cansativo. Talvez em outra oportunidade.


Quem é contra a redivisão talvez deseje que o Brasil volte a ser um conjunto de capitanias. Talvez a paulista e paulistana “Veja” e o paulista e paulistano Toledo não se opusessem ao retorno de São Paulo ao território do Rio de Janeiro, a cujo governo “ficou sujeito, tanto administrativamente como no Judiciário”, como anotou Ildefonso Escobar. Ou, alternativamente, São Paulo reintegre-se ao território da Bahia, de cujo governo “ficou dependente” também. Talvez os paranaenses não se importem se seu estado voltar a pertencer a São Paulo. Talvez os paulistas não se incomodem (afinal, tudo é Brasil) de devolver ou buscar o que lhe é de direito em relação aos territórios de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso. Talvez a capital Curitiba e o estado de Santa Catarina voltem correndo para se reincorporar ao estado paulista. Talvez o Rio de Janeiro queira de volta a São Paulo que por algumas vezes lhe tiraram, em um puxa-encolhe que, como sanfona, resfolegou, veio e voltou do século 16 ao século 18.


O Maranhão do Sul será uma realidade -- não por força de “jogadas” de enfraquecimento político que nunca existiram. O Maranhão do Sul, mais dias menos dias, virá -- não por birra inútil ou vontade fútil. Não. Ele acontecerá como parte do debate nacional e da tendência e prática internacional de dividir mais (o território) para dividir melhor (seus recursos entre os cidadãos). Nestes momentos -- e também nos demais --, a corrupção não deve ser entendida como regra, mas como anomalia. Ela é um desvio de caráter humano, não uma característica de gestão da coisa pública, da Ciência Administrativa.Em sonho, em lutas, em riquezas materiais, em potencialidades de toda ordem, o Maranhão do Sul é grande. É maior do que a ignorância daqueles que, por falta de interesse ou oportunidade, ainda não sabem do que estão falando. Ou escrevendo.


(Para saber um pouco mais, visite: http://estadomaranhaodosul.blogspot.com).


(*) EDMILSON SANCHES, jornalista, consultor e pesquisador, é autor de livros nas áreas de Administração, Comunicação e Desenvolvimento. E-mail: edmilsonsanches@uol.com.br .
Para ler o artigo de Veja, clique aqui.

O dia em que o Brasil foi invadido



Animação de recortes, que mostra a hipotética invasão do Brasil pelos EUA, com o objetivo de tomar posse dos recursos naturais do país. A elite das forças especiais do exército americano irá liderar a invasão. Só um país será o vencedor.

Animação feita como projeto de conclusão de curso das Faculdades Integradas Barros Melo.

sexta-feira, 10 de agosto de 2007

Emoções fortes

A jurisdição eleitoral é a mais emocionante de todas, pois transfere para a arena judiciária a apaixonante disputa política. Claro, as regras do jogo são outras, regras jurídicas, com direito a contraditório, ampla defesa e todo o caudal de procedimentos formais que exigem a intervenção especializada de consultores e advogados. Tudo isso, que em outros campos costuma esfriar o debate jurídico na arena judicial - pensem numa matéria de direito tributário sendo discutida logo depois do almoço no plenário de um tribunal qualquer -, no campo eleitoral costuma trazer mais ingredientes perturbadores para o processo. Quanto maior é a incerteza do resultado, quanto mais "perturbado" por fatores internos e externos é o processo que pretende cassar mandato obtido nas urnas, mais emocionantes são os julgamentos do TSE.

Ontem, o TSE iniciou o julgamento de dois recursos contra a expedição de diploma. No primeiro caso, pede-se a cassação da senadora Rosalba Ciarlini, do DEM do Rio Grande do Norte. Alega-se que a senadora teria cometido abuso de poder. O julgamento do Recurso contra Expedição do Diploma (RCEd 673) foi suspenso nesta quinta-feira (9) por um pedido de vista do ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Até agora, três ministros do TSE votaram pela rejeição do recurso e dois, pela cassação da senadora. Se a votação ficar em 3 x 3, cabe o presidente da Corte, ministro Marco Aurélio Mello, desempatar.
A tese levantada pelo Ministro Peluso para abrir a divergência em favor da cassação do mandato de Rosalba é relativamente nova no TSE, a tese da fraude à lei. Citando o jurista Pontes de Miranda, para quem há duas formas de se praticar uma ilicitude: a ofensa direta à lei e a “fraude à lei”, quando o agente recorre a uma norma lícita para mascarar a prática de um ilícito, com o intuito de induzir o julgador a erro, o Ministro entende que a senadora praticou “um plano engenhoso de fraude à lei”. Peluso observou, ainda, que as qualidades da candidata - que exerceu três mandatos como prefeita de Mossoró, segunda maior cidade do estado – “não explicam ou justificam a exposição sistemática” – 64 vezes, em cinco meses, na mesma emissora de TV. O ministro também lembrou a capacidade de influência sobre a opinião pública da televisão. Nesse ponto, considerou a pequena diferença de votos entre a senadora e o adversário derrotado – uma margem de apenas 0,76%. “Seria preciso negar a força extraordinária do meio de comunicação mais poderoso, que é a televisão, para se dizer que não tivesse a potencialidade de alterar seis mil votos”, afirmou, aludindo à diferença de votos entre a eleita e o adversário derrotado no pleito. “Houve o uso indevido e estudado dos meios de comunicação”, salientou.
Na verdade a tese de fraude à lei já havia sido manejada por Peluso quando foram julgadas as contas da campanha do Presidente Lula. Naquele julgamento, ficou vencido. Vamos observar o desfecho deste para ver se a tese será acolhida pela pequena maioria do TSE. Para isso, faltam apenas dois votos, os dois ministros que ainda não votaram, Menezes Direito e Marco Aurélio.
No segundo caso, o julgamento apenas começou, mas já trouxe fortes emoções, pois o relator do recurso contra a expedição do diploma do governador de Santa Catarina votou pela cassação do mandato de Luis Hernrique. Após o voto do relator, ministro José Delgado, que recomendou a cassação, o julgamento foi suspenso por um pedido de vista do ministro Ari Pargendler. Continuaremos aqui a observar.

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Fidelidade à jurisprudência II

“Não obstante todas essas considerações que venho a expor – e embora atribuindo especial relevo à resolução, pelo Egrégio Tribunal Superior Eleitoral, da Consulta nº 1.398/DF, relator ministro César Asfor Rocha – não posso, contudo, deixar de ter presentes, ao menos neste juízo de sumária cognição, as decisões emanadas do Plenário do Supremo Tribunal Federal (MS. 20916/DF, relator para o acórdão Min. Sepúlveda Pertence), no sentido da 'inaplicabilidade do princípio da fidelidade partidária aos parlamentares empossados (...)' RTJ 153/808-809, Rel Min. Moreira Alves)”.
Ministro Celso de Mello, 9.8.2007, ao indeferir a liminar pedida pelo PSDB em mandado de segurança.

O partido tucano pretende reaver as vagas na Câmara dos Deputados que perdeu quando parlamentares eleitos sob sua legenda em 2006 se transferiram para outras agremiações políticas. A crônica chama isso de troca-troca partidário, fisiologismo, outros chamariam de coalizão de governabilidade, enfim, é caso mais que explícito de infidelidade partidária. Certo. Mas isso é reflexo da fragilidade dos partidos sobretudo. Veja o próprio PSDB, que é uma dissidência do PMDB, governou durante 8 anos o país em circunstâncias muito parecidas do ponto de vista da sustenção parlamentar do Governo, especialmente para fazer "grandes" reformas, reformas constitucionais - são quantas já, 53? - o PSDB que agora desistiu da reforma política, do voto em lista que só tenderia a fortalecer os partidos, o PSDB foi um dos que pediram ao STF que ordenasse a cassação judicial dos mandatos dos deputados que trocaram de partido depois de eleitos. Aqui n'APonte acompanhamos esses movimentos. Os outros dois são o DEM e o PPS. Ambos também perderam deputados para outros partidos, todos da base do Governo, se não me engano. Ambos também se desprenderam de outros partidos, PDS e PCB, respectivamente. Na época das vacas gordas da governabilidade, tucanos e pefelistas eram destinatários de parlamentares fujões. Naquela época, o STF já dizia que não era possível impor fidelidade partidária sem regra explícita na Constituição, como a que havia, por exemplo, na Constituição militar de 69. Era preciso, portanto, realizar uma reforma política para que se pudesse impor aos deputados a fidelidade partidária. Nunca foi votada a tal reforma política, que chegou a ser chamada de a mãe de todas. Ironia, de tudo que se cogitou esse ano, parece que só sobreviverá a fidelidade partidária (pariu um rato a montanha). Vale a pena ler de novo o voto do Ministro Pertence no MS 20.916/89 para esclarecimento do estado da arte da jurisprudência do Supremo sobre fidelidade partidária. É este o entendimento que predomina até hoje. Impor fidelidade sem lei que o defina não ousou o STF... Até hoje.

"Tudo seria diferente, na vigência do art. 35, V, da Carta de 69, expressa em estabelecer, entre as hipóteses de perda de mandato, a prática de atos de infidelidade partidária, segundo o previsto no parágrafo único do art. 152, o qual, por sua vez, explicitamente enumerava como infidelidade partidária o abandono do partido pelo qual fora eleito o titular. Essa regra foi amainada, salvo engano, pela Emenda 11, no caminho da abertura para o pluripartidarismo, que permitiu o abandono do partido pelo mandatário, quando se destinasse à fundação de outro partido. Mas veio afinal a ser revogada essa hipótese de perda de mandato, na Emenda Constitucional 25/85. A atual Constituição não cuida de nada parecido, limitando-se a dizer que os Estatutos partidários prescreverão normas de disciplina. Mas, a meu ver, obviamente não poderão chegar a inserir uma nova hipótese de perda de mandato para os seus filiados...O ponto está assim, data venia, não em raciocinar a partir dos princípios do sistema proporcional, em relação exclusivamente ao suplente, mas, sim, ante a evidência de que, hoje, esses princípios teóricos do mandato proporcional não levam à perda do mandato.(...)Lamento, assim, Senhor Presidente, que não possa ceder - como disse - à tentação do fortalecimento do vínculo do mandato pelo qual, acho, passa a construção de uma democracia viável. Mas não tenho como dar esse tratamento severo ao mandatário eventual, ao suplente, quando não posso impô-lo ao titular, malgrado esse espetáculo pouco edificante, a que a nação assiste nos últimos meses, da dança dos mandatários titulares, destinados a dar segundos ou minutos na propaganda eleitoral gratuita a este ou àquele candidato.Essa impunidade do titular que deserta da legenda pela qual se elegeu - a qual decorre inevitavelmente da Constituição -, mostra que não faz sentido, data venia, continuar a dizer que o mandato é também do partido, por amor a princípios que o texto positivo não perfilhou. E se o mandato não é do partido, senão enquanto a permanência de seu vínculo aprouver ao titular, não vejo como impô-lo apenas ao suplente, até porque a mesma fidelidade não mais lhe seria exigível, desde o momento em que sucedesse o mandatário.Nem vejo explicação jurídica, data venia, para que o suposto direito de um partido ao mandato, extinto com a transmigração do mandatário a outra legenda, renescesse das próprias cinzas, quando se fosse cuidar de sua sucessão na vacância por qualquer motivo.Lamentando assim dissentir dos doutos votos que me antecederam, denego a segurança."

Ministro Sepúlveda Pertence