quarta-feira, 29 de agosto de 2007

Mensalão: epílogo

Ministra Ellen Gracie:


Senhores Ministros, Senhora Ministra, o Tribunal, neste momento, encerra a apreciação da denúncia oferecida pelo Senhor Procurador-Geral da República, com base no Inquérito 2.245. Ao proclamar o resultado dos trabalhos desenvolvidos por este plenário, nos últimos três dias da semana passada, ontem e hoje – no total, estivemos, nessas bancadas, mais de trinta horas -, desejo registrar que o Tribunal conclui esta primeira fase em prazo absolutamente compatível tanto com a dimensão do caso – que é sui generis, com quatro dezenas de acusados e extrema complexidade -, como também com as demais tarefas que correspondem ao cotidiano dos Senhores Ministros. Neste momento, não posso deixar de consignar – espero que os Colegas não me queiram mal por isso – que, no intervalo deste julgamento, fizeram-se distribuir 2.094 processos na Casa. E, mais importante que tudo, com absoluto e rigoroso respeito ao devido processo legal.

Esses resultados só se fazem possíveis na medida e graças à segura condução do processo, empreendida pelo eminente Relator, Ministro Joaquim Barbosa. Sua Excelência fez também por utilizar recursos modernos de informática que facilitaram muito o seu trabalho, e também o nosso. Os autos foram, em seus cerca de cinqüenta e um volumes e mais de mil apensos, da primeira à última página, inteiramente digitalizados. Assim, foi possível que todos os Ministros tivessem acesso às peças do processo. Foi possível também aos ilustres defensores dos quarenta acusados o acesso simultâneo a este mesmo processo.

Não fosse por isso, somente a vista sucessiva dos autos teria consumido, no mínimo, por baixo, vinte meses, para que cada um dos acusados pudesse se manifestar nos autos. Não teríamos, portanto, chegado ao estágio atual. O mesmo ganho de tempo será reproduzido na fase instrutória. Isso nos leva a crer que a utilização desses recursos, dessa tecnologia que serve à celeridade processual, deve prosseguir. Por isso mesmo, tivemos debates tão informados, neste Plenário, em todo o transcorrer das sessões de julgamento.

É importante constatar também, senhoras e senhores, no momento em que encerramos a fase de recebimento desta denúncia, o quanto são equivocadas algumas opiniões pouco informadas sobre a eficiência deste Tribunal no trato da matéria penal. Vossas Excelências já tomaram conhecimento dos dados levantados pela Presidência durante o mês de recesso, o mês de julho. Esses dados revelam que, a partir de 1988 – e essa era a afirmação equivocada com relação a esta Corte; esse era o corte de tempo feito -, até o momento atual – o ano de 2000 -, o Tribunal já recebeu 143 ações penais, não mais que isso, ao longo de todo esse período.

É importante revelar, porque nem todos o sabem, que o Tribunal só pôde apreciar efetivamente ações penais a partir da autorização que lhe vem da Emenda Constitucional nº 35, a qual tem data de 20 de dezembro de 2001. Portanto, se mora houvesse desta Corte, ela só se poderia contar a partir do ano de 2002. Sabem todos que, antes disso, a Casa não processava sem a autorização das Casas Legislativas; e esta autorização não era deferida.

É importante revelar também – e, creio, este é o dado mais interessante – que, nesta Casa, tramitam, hoje, não mais que cinqüenta ações penais, dentre as quais agora se inaugura mais uma – são cinqüenta e uma. De todas as ações penais em tramitação nesta Casa, as duas mais antigas contam com pouco mais de quatro anos de tramitação. Em uma delas, ao menos três anos foram gastos tão-somente para a ouvida de testemunhas de defesa.

Cerca de 50% dessas cinqüenta ações têm menos de seis meses de tramitação. Indago a Vossas Excelências se conhecem algum juízo criminal em situação tão confortável quanto à desta Corte em relação à tramitação das suas ações penais. O mesmo se há de dizer com relação aos inquéritos em andamento. De novo, certa de 50% deles têm menos de seis meses de tramitação.
Já quanto às petições criminais, que veiculam alguma informação de natureza criminal que ainda não se transformou em inquérito, o número é ainda maior: temos mais de 67% delas com menos de seis meses de tramitação.

Creio que tudo isso revela o intenso trabalho dos eminentes Relatores; revela as dificuldades processuais que temos de enfrentar; revela também o intenso labor feito perante esta Casa, tanto pela Procuradoria-Geral, na acusação, quanto pelos nobres advogados defensores dos acusados.

Sem dúvida nenhuma, tenho dificuldades em acreditar que alguma Corte Suprema, no mundo, se reúna, na sua composição plenária, para o recebimento de denúncia com essas minúcias, esse detalhe, esse esforço analítico desenvolvido aqui, apesar de termos a quantidade de trabalho que todos os Senhores bem conhecem.

Neste momento em que encerramos este julgamento considerado histórico por muitos, é importante se restabelecer a verdade sobre fatos que dizem respeito ao funcionamento desta Casa, especialmente ao seu funcionamento em matéria criminal. A Casa tem uma longa história. Ela se credencia, perante a nação, por um desempenho notável no decorrer do tempo. É importante que, vez ou outra, tenhamos voz para refletir a realidade do nosso trabalho.

Ministro Celso de Mello:

Senhora Presidente, na linha do que Vossa Excelência expõe, também é preciso revelar, àqueles que demonstram o conhecimento da nossa realidade constitucional, que Deputados Federais e Senadores da República só passaram a ter prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, nas infrações penais comuns, a partir da Carta Federal de 1969, travestida de Emenda Constitucional nº 01, daquele mesmo ano. Até então, sob a égide das Constituições Republicanas de 1891, de 1934, de 1937, de 1946 e de 1967, até o advento da chamada Emenda nº 01, de outubro de 1969 - Carta Federal de 1969 -, os membros do Congresso Nacional não tinham essa prerrogativa de foro. Tanto que o Supremo Tribunal Federal se viu obrigado a formular um enunciado sumular: a Súmula nº 398, com este conteúdo: “O Supremo Tribunal Federal não é competente para processar e julgar, originariamente, Deputado ou Senador acusado de crime.”
Isso sobreveio com o advento da Carta Federal de 1969. Digo assim porque a maior clientela do Supremo Tribunal Federal na área penal situa-se exatamente no Congresso Nacional, em ambas as Casas Legislativas. Portanto, o Supremo Tribunal Federal somente passou a se defrontar com processos penais originários em relação aos membros do Congresso Nacional a partir de outubro de 1969.
Há que se registrar e observar, ainda, tal como bem salientado por Vossa Excelência, que, mesmo em relação aos congressistas, salvo por um pequeno intervalo de tempo, só se podia proceder contra eles em face de licença expressamente concedida pela Casa Legislativa respectiva. Essa licença jamais era dada. Tomei posse nesta Corte em agosto de 1989 e, enquanto vigorou esse regime de imunidade parlamentar formal, não constatei qualquer situação em que as Casas do Congresso houvessem concedido licença para que um procedimento penal - instaurado por iniciativa do Ministério Público, ou eventualmente nas hipóteses de querelas privadas -tivesse seqüência. Havia obstáculos constitucionais que impediam, na verdade, a formulação, por esta Corte, de qualquer juízo condenatório.

O SR. MINISTRO CARLOS BRITTO – Senhora Presidente, creio que é de justiça consignar aqui o impecável e irretocável desempenho de Vossa Excelência no planejamento deste julgamento que se encerra, verdadeiramente histórico e timbrado por tantas dificuldades e tanta complexidade de ordem técnica. Todos somos testemunhas da extrema organização, por parte de Vossa Excelência, no que tange ao planejamento das nossas atividades e ao empenho pessoal para que tudo desse certo e acontecesse a tempo e a hora, para chegarmos a esta terça-feira com o julgamento da denúncia completamente encerrado. Cumprimento Vossa Excelência com toda a sinceridade.

Ministra Ellen Gracie (Presidente): Senhores Ministros, Senhora Ministra, está encerrada a sessão.

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