Filho de Lula é inelegível, ou a verticalização de um impedimento
Essa decisão me parecia evidente, mas mesmo assim houve dois votos vencidos no TSE, o voto dos ministros Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski. Mas vamos ao caso.
O filho do Presidente, Marcos Cláudio Lula da Silva, pretendia se candidatar ao cargo de vereador na cidade de São Bernardo, Grande São Paulo. Seu registro de candidatura foi impugnado à luz do § 7º do art. 14 da Constituição, aquele que estabelece a inelegibilidade por parentesco. Ali está dito que são inelegíveis no território de jurisdição do titular o cônjuge e os parentes do prefeito do Governador e do Presidente da República.
O segredo, ou seja, a razão da inelegibilidade do pretenso candidato está na expressão "território de jurisdição do titular". O titular é aquele que exerce o cargo de prefeito, governador ou presidente. É da posição jurídica dessa pessoa que surge o impedimento para o parente ou cônjuge. A pergunta inicial para resolver o problema é: onde essa pessoa exerce sua jurisdição, em que território? Se prefeito, no Município; Governador, no Estado; Presidente, no território nacional. Pronto? Mais ou menos. Acabei de ler a notícia da decisão do TSE, ali se diz que o Relator, Min. Fischer, entendeu que, para esse efeito, jurisdição e circunscrição são sinônimos. Será mesmo?
O conceito de circunscrição eleitoral têm definição legal, o art 86 do Código Eleitoral, onde se lê que nas eleições presidenciais a circunscrição será o País (competência do TSE), nas federais e estaduais, será o Estado (TRE), e nas municipais, o respectivo Município (Juiz Eleitoral).
A Constituição não falou em circunscrição para fixar o regime das inelegibilidades por parentesco, falou em território de jurisdição. Isso faz toda a diferença. O Governador de um Estado tem "jurisdição" em todo território deste Estado, o que alcança o território de todos os Municípios que o compõem. Mas a eleição para Governador ocorre apenas na circunscrição Estado, não se mistura com a eleição de cada município que, aliás, ocorre em época diversa. Resumindo, se a Constituição usasse a expressão "circunscrição" e não "jurisdição", os parentes e cônjuge do Governador poderiam se candidatar a prefeito e/ou a vereador em qualquer cidade dentro de Estado governado pelo pai ou pela mãe. Resultado: de pouco valeria impor a inelegibilidade por parentesco. Ou melhor dito, ela teria função apenas para impedir que os parentes concorressem nas eleições disputadas dentro da mesma circunscrição, por exemplo, o filho do Governador não poderia concorrer ao cargo de deputado ou senador pelo Estado governado por seu pai, pois são eleições (deputado estadual, federal e senador) que ocorrem na circunscrição estadual.
O mesmo raciocínio se aplica aos prefeitos, que impedem todos os seus parentes na eleição municipal; e se aplica também ao Presidente que impede todos os seus parentes de concorrem a qualquer cargo eletivo na República. As únicas ressalvas admitidas pela Constituição são a desincompatibilização (renúncia) do cargo até seis meses antes do pleito e na hipótese em que o parente já for titular de mandato eletivo e candidato à reeleição. No caso do filho de Lula, nunca houve nenhuma dessas hipóteses.
Essa é a verdadeira verticalização. Na verticalização de coligações partidárias (2002 e 2006), o TSE misturou os conceitos de jurisdição e circunscrição com a tese dos partidos nacionais e construiu uma regra que nunca esteve presente no Direito Eleitoral brasileiro. Aqui nesse caso, não. A verticalização dos impedimentos eleitorais causados por parentesco emana do próprio texto constitucional.
Nenhum comentário:
Postar um comentário