quarta-feira, 28 de março de 2007

O TSE e a fidelidade partidária: conseqüências

Pronto, começaram os desdobramentos da decisão do TSE de impor fidelidade partidária, ou melhor, de declarar que o mandato do parlamentar eleito pelo sistema proporcional pertence ao partido (ou a coligação) que atingiu o quociente, e que, se aquele muda de legenda depois da eleição, perde a vaga.

Além da repercussão política que já mobiliza os chamados grandes partidos e da anunciada demanda judicial, a Agência TSE acaba de divulgar que o PSL apresentou uma nova consulta, formulando duas perguntas:

1) “Considerando que não existe o instituto da fidelidade partidária, pode o suplente assumir o mandato (titularidade do cargo) sem que o legitimado renuncie à condição da titularidade para o suplente?”

2) “Considerando entendimento deste Egrégio Tribunal no sentido de que pertence ao partido e não ao candidato, individualmente, o mandato, a Consulta 1398 está sujeita ao princípio da anualidade?”

A primeira questão explicita o desejo daqueles que perderam parlamentares para outros partidos: cassar o mandato dos deputados transeuntes.

Ocorre que as consultas do TSE não fazem coisa julgada, ou seja, não têm a natureza de decisão jurisdicional, mas se depender apenas da motivação da Corte é melhor aguardar antes de prgnosticar:

Penso que o julgamento desta Consulta traz à tona a sempre necessária revisão da chamada teoria estruturalista do Direito, que tendeu a explicar o fenômeno jurídico somente na sua dimensão formal positiva, como se os valores pudessem ser descartados ou ignorados, ou como se a norma encerrasse em si mesma um objetivo pronto, completo e acabado.

Com efeito, as exigências da teoria jurídica contemporânea buscam compreender o ordenamento juspositivo na sua feição funcionalista, como recomenda o Professor Norberto Bobbio (Da Estrutura à Função, tradução de Daniela Beccacia Versiani, São Paulo, Editora Manole, 2007), no esforço de compreender, sobretudo, as finalidades (teleologias) das normas e do próprio ordenamento.

Ouso afirmar que a teoria funcionalista do Direito evita que o intérprete caia na tentação de conhecer o sistema jurídico apenas pelas suas normas, excluindo-se dele a sua função, empobrecendo-o quase até à miséria; recuso, portanto, a postura simplificadora do Direito e penso que a parte mais significativa do fenômeno jurídico é mesmo a representada no quadro axiológico.

Outro ponto relevante que importa frisar é o papel das Cortes de Justiça no desenvolvimento da tarefa de contribuir para o conhecimento dos aspectos axiológicos do Direito, abandonando-se a visão positivista tradicional, certamente equivocada, de só considerar dotadas de força normativa as regulações normatizadas; essa visão, ainda tão arraigada entre nós, deixa de apreender os sentidos finalistícos do Direito e de certo modo, desterra a legitimidade da reflexão judicial para a formação do pensamento jurídico.Volto, ainda esta vez, à companhia do Professor Paulo Bonavides, para, com ele, afirmar que as normas compreendem as regras e os princípios e, portanto, estes são também imediatamente fornecedores de soluções às controvérsias jurídicas.

Observo, como destacado pelo eminente Ministro Cezar Peluso, haver hipóteses em que a mudança partidária, pelo candidato a cargo proporcional eleito, não venha a importar na perda de seu mandato, como, por exemplo, quando a migração decorrer da alteração do ideário partidário ou for fruto de uma perseguição odiosa.

Com esta fundamentação respondo afirmativamente à consulta do PFL, concluindo que os Partidos Políticos e as coligações conservam o direito à vaga obtida pelo sistema eleitoral proporcional, quando houver pedido de cancelamento de filiação ou de transferência do candidato eleito por um partido para outra legenda.

É o voto.

Min Cesar Rocha, relator.

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