Ao referendar a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que proíbe a troca de partidos pelos parlamentares das câmaras legislativas, o Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a interferir no funcionamento dos demais Poderes. A exemplo do que ocorreu em outras disputas políticas, entre as quais o caso do “mensalão” talvez seja o mais ilustrativo, o Supremo somente agiu após ter sido acionado por partidos. Esse é o principal traço do STF: por sua natureza e função, ele não pode deixar de decidir sempre que provocado, principalmente quando a ordem jurídica não for clara e a legislação contiver lacunas e antinomias. Essa regra garante o funcionamento do Estado de Direito.O número de casos com grande repercussão institucional submetidos ao STF tem crescido extraordinariamente nos últimos anos. Muitas vezes, a última instância do Judiciário é acionada quando os conflitos políticos entre o Executivo e o Legislativo culminam em impasse. Outras vezes são as lideranças partidárias que, incapazes de chegar a acordos no exercício de suas atividades parlamentares, acabam batendo nas portas do Supremo pedindo a arbitragem de seus ministros. Foi exatamente isso que ensejou a decisão do STF sobre a fidelidade partidária. Pela Constituição, a reforma política é matéria de competência do Legislativo. Como esse Poder não se dispõe a promovê-la, a questão foi deslocada para o Judiciário. Algo idêntico ocorreu há um mês, quando o STF decidiu que as greves do funcionalismo serão disciplinadas pelas mesmas regras aplicáveis aos trabalhadores da iniciativa privada até a aprovação da lei complementar prevista pelo artigo 37 da Constituição. Quase 20 anos após a promulgação da Carta, nem o Legislativo nem o Executivo cumpriram o que é atribuição sua. Há três semanas, líderes do PSDB e do DEM cogitaram de levar ao STF a polêmica em torno da imposição do voto fechado no julgamento, pelo plenário, do processo aberto pela Comissão de Ética contra o presidente do Senado, Renan Calheiros.Em todos esses casos, o STF somente entrou em cena porque o Legislativo não cumpriu o seu papel. Esse crescente protagonismo da magistratura constitui o que juristas e sociólogos chamam de “judicialização da política”. O fenômeno não é novo e ficou conhecido na Itália, na década de 1990, quando os juízes passaram a autorizar a prisão de líderes políticos acusados de envolvimento com a máfia. A Operação Mãos Limpas foi um sucesso, mandando para a cadeia personalidades até então tidas como insuspeitas. Mas muitos magistrados italianos passaram a interferir excessivamente na vida administrativa e econômica do País, o que levou à chamada “politização da Justiça”. Com sentenças ideologicamente enviesadas e justificadas em nome da “depuração da classe política”, os juízes exorbitavam de suas prerrogativas, tomando iniciativas que não lhes cabia tomar sem serem provocados para isso, o que resultou em confusão institucional. Evidentemente, ainda que a decisão do STF com relação à fidelidade partidária tenha sido aprovada pela maioria esmagadora da sociedade, o Brasil não está imune ao efeito colateral da “judicialização da política”. Como a Constituição de 88 é repleta de princípios vagos - as chamadas “ normas programáticas”-, ao interpretá-los os ministros dos tribunais superiores dispõem de tantas possibilidades hermenêuticas que, na prática, podem acabar legislando embora não tenham mandato para isso. É a “politização da Justiça” que o sociólogo Fábio Wanderley Reis chamou, em artigo publicado no jornal Valor, de “pretorianismo da toga” - numa alusão à intervenção das Forças Armadas na vida política. É claro que a democracia brasileira não está correndo riscos, mas, em vez de gerar certeza do direito, os juízes do STF podem acabar aumentando a insegurança jurídica. Quando tribunais e juízes ultrapassam os limites que o sistema jurídico lhes impõe, politizando a aplicação do direito, o que se tem é confusão institucional. É esse o risco que o STF tem de aprender a evitar quando chamado a fechar lacunas abertas pelo Congresso.
Mestre em Direito.
Especialista em Direito Eleitoral. Professor de Direito Eleitoral e de Constitucional no UniCEUB. Músico nas horas que vagam. Vagavam muito mais antigamente.
Precisei chamar de crônicas, não ousaria chamar de doutrina as análises que fiz da jurisprudência eleitoral. São observações contemporâneas sobre o trabalho decisório do Tribunal. A pesquisa foi feita na internet com informações oficiais do TSE, a íntegra dos Acórdãos na pesquisa de jurisprudência, mas também o acompanhamento semanal dos julgamentos no sítio de notícias do Tribunal.
Há fatos que ainda nem esfriaram direito, mas já estão devidamente registrados no livro, como é o caso da fidelidade partidária. Digo isso porque o PGR já pediu ao Supremo que declare a inconstitucionalidade da Resolução que trata do processo de perda de mandato por infidelidade partidária. Falou em usurpação do Poder Legislativo, matéria processual... Veja como é mutante a jurisprudência nessa matéria, as eleições e sua disciplina. É, chamar de crônicas é melhor.
Mais informações: mauro.noleto@hotmail.com
Aponte os princípios
APonte tem vocação acadêmica. Foi criada pra isso. Como apoio pedagógico da disciplina Direito Eleitoral que passei a lecionar no UniCEUB no ano de 2007. Portanto, pretende apresentar temas e conceitos de interesse, recolher material empírico na Política, mas principalmente no Poder Judiciário, mais precisamente, na jurisprudência eleitoral e constitucional. APonte é também, e necessariamente - considerando a natureza dos blogs -, um diário pessoal. Manifesta mais que opinião livre, é registro pessoal. Por isso, permite outras linguagens para comunicar subjetividade: a música, o vídeo, literatura, a poesia em especial; as imagens (extraídas da internet no próprio google image e com o devido registro da fonte), bem, APonte não tem interesse comercial, trato as imagens como citações pictográficas, assim como os textos. Mas se houver qualquer reclamação dos proprietários - mesmo que queiram renunciar a serem acessados pelos eventuais leitores daqui - a citação será excluída. APonte, como todo diário, é também jornal. Journal. Jornada dos interesses de seu autor. Não é jornalismo, mas é jornalística. APonte tem editor, tem edição, pois. Tenho alterado as postagens antigas, melhoram muito. Mas, é basicamente limpeza sintática. O conteúdo das mensagens não se altera. APonte tem arquivos, os apontamentos estão salvos, eu espero. E classificados, em seções. Há também ícones, banners, bandeiras, desejos, livros, bushismos, tudo do lado esquerdo, menos os bushismos, que estão em baixo. Aponte tem muitos sentidos. Liberdade. Democracia. Respeito. Beleza. Justiça. Solidariedade. Dignidade. Individualidade. APonte concorda com Boaventura de Sousa Santos. Precisamos de: "um conhecimento prudente para uma vida decente".
O Senador Eduardo Azeredo quer criminalizar basicamente tudo o que fazemos na internet: citar, copiar, colar, compartilhar. Reproduzo aqui o convite aos leitores d'APonte a que assinem a petição escrita por Sergio Amadeu e André Lemos. O selinho acima foi retirado do blog do Idelber Avelar, que, por sua vez, copiou do Sergio Amadeu: se aprovado o projeto de Azeredo, todos estaríamos cometendo crime ao circular este selinho.
O livro Subjetividade Jurídica foi editado em 1998, pela editora Sergio Fabris de Porto Alegre. É minha dissertação de mestrado, praticamente o mesmo texto apresentado na banca composta pelos professores João Maurício Adeodato, de Pernambuco e Roberto Aguiar, da UnB. Meu orientador foi José Geraldo de Sousa Jr. e o texto tem as credenciais do Direito Achado na Rua. Não escrevi uma monografia, fiz ensaios. Enredei-me tanto nas questões epistemológicas e éticas que acabei transgredindo a metodologia. Tinha certeza de estar fazendo a coisa certa, pois inspirado na prosa de Roberto Lyra Filho, em suas imagens e deboches cheios de convicção e esperança. Não terei conseguido traduzir bem seu humanismo dialético, mas rendi minha homenagem a seu talento a serviço da emancipação humana.
É um texto de que gosto muito, é autêntico, até nas limitações teóricas. Sua epígrafe é um poema de Manoel de Barros, Uma Didática da Invenção. Foi indicado em pelo menos dois exames de Mestrado. Em Santa Catarina, na Universidade Federal e em Franca, na UNESP.
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