Vamo lá. Um pouco de imaginação não machuca ninguém. Que cenário judicial o problema ainda projeta, refiro-me às implicações estritamente eleitorais do suposto descumprimento do parágrafo 10º da lei eleitoral. Antes vale uma palavra sobre o sub-sistema das condutas vedadas. E outra palavra sobre leis mal feitas.
As condutas vedadas aos agentes públicos em época de campanha eleitoral estão expressamente previstas no art. 73 da L. 9504, a lei das eleições. Quando alguém é pego praticando uma dessas condutas proibidas - abuso de poder político - a própria lei tem um conjunto de sanções, expostas em parágrafos do artigo. As condutas estão descritas nos vários incisos. Mas, vamos ver as sanções:
§ 4º O descumprimento do disposto neste artigo acarretará a suspensão imediata da conduta vedada, quando for o caso, e sujeitará os responsáveis a multa no valor de cinco a cem mil UFIR.
§ 5o Nos casos de descumprimento do disposto nos incisos I, II, III, IV e VI do caput, sem prejuízo do disposto no parágrafo anterior, o candidato beneficiado, agente público ou não, ficará sujeito à cassação do registro ou do diploma. (Redação dada pela Lei nº 9.840, de 28.9.1999)
§ 6º As multas de que trata este artigo serão duplicadas a cada reincidência.
§ 7º As condutas enumeradas no caput caracterizam, ainda, atos de improbidade administrativa, a que se refere o art. 11, inciso I, da Lei nº 8.429, de 2 de junho de 1992, e sujeitam-se às disposições daquele diploma legal, em especial às cominações do art. 12, inciso III.
§ 8º Aplicam-se as sanções do § 4º aos agentes públicos responsáveis pelas condutas vedadas e aos partidos, coligações e candidatos que delas se beneficiarem.
Observem que as sanções possíveis são: suspensão imediata da conduta, multa, cassação do registro ou do diploma do candidato eleito e ainda a possível caracterização da conduta como ato de improbidade administrativa. Não há, nesse rol, a temível sanção de inelegibilidade. Pelo menos não diretamente. Quer dizer, no TSE, se for condenado o Presidente por ter ampliado em ano eleitoral a concessão de bolsas, ele não será candidato a prefeito, portanto, não teria seu registro ou diploma cassado. Poderia sofrer uma multa e ter de interromper o programa, mas não seria declarado inelegível com base nesse pequeno conjunto de sanções da lei das eleições (art. 73).O que eu quero dizer é que os efeitos de uma possível condenação, no TSE, pela ampliação das bolsas do Pronasci é quase nulo sobre Lula. Poderia sobrar para os candidatos do partido, mas, isso é outro problema.
Agora uma palavra sobre leis mal feitas. O Governo é acusado de descumprir o parágrafo 10º do art. 73, uma regra isolada, nova, acrescentada à Lei 9504 11 anos depois do início de sua vigência. Mas, tem um detalhe, o parágrafo novo é omisso em relação à sanção:
§ 10. No ano em que se realizar eleição, fica proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, exceto nos casos de calamidade pública, de estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e já em execução orçamentária no exercício anterior, casos em que o Ministério Público poderá promover o acompanhamento de sua execução financeira e administrativa. (Incluído pela Lei nº 11.300, de 2006)
Pra resumir. Criou-se a proibição, mas não se teve o cuidado de encaixar corretamente essa proibição na lei já existente. O certo seria acrescentar mais um inciso ao art. 73 com essa vedação e submeter seu descumprimento às sanções do parágrafo 4º e seguintes. Resultado: na omissão da lei, a construção judicial do direito emergirá novamente.
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