sábado, 22 de março de 2008

"Palanques Virtuais em Construção"

Este é o título do artigo de Francisco de Assis Brandão Jr., sobre a possibilidade de a internet tornar-se um espaço de divulgação política mais amplo e democrático. Aborda a tímida regulação do tema no Brasil e a compara com o tratatamento dado ao assunto nos EUA e no Reino Unido. O artigo, de 2005, foi elaborado no âmbito do curso de aperfeiçoamento em mídia e política do ICP da Universaidade de Brasília. A pedido do autor, publiquei o texto no site da Escola Judiciária Eleitoral do TSE, no período em que coordenei a EJE. Acho, infelizmente que poucos leram esse excelente trabalho lá no Tribunal. Segue a introdução e o link para o texto completo:

A internet oferece a possibilidade de se tornar um espaço midiático mais amplo e democrático para a participação política. Mais do que uma nova tecnologia, trata-se de um meio de comunicação, de interação e de organização social. Manuel Castells observa que,"em princípio", a internet poderia ser um instrumento de participação cidadã extraordinário,uma "ágora política" com os mais variados projetos e idéias. Quanto às eleições, canal que segundo Lúcia Avelar tem recebido excessiva ênfase como o cerne das atividades de participação política do cidadão, as perspectivas são particularmente animadoras em relação à propaganda política e partidária pela internet. Isto porque a rede mundial de computadores não dispõe das limitações de espaço, como a mídiaimpressa, nem de tempo, como o rádio e a televisão. E, mais importante, o custo de produção e manutenção de um sítio (site) eleitoral é bem inferior ao da veiculação da propaganda eleitoral nas mídias tradicionais – cujo alto preço gera por si só, na definição de Wilson Gomes, "um mecanismo de exclusão ou um mecanismo que, pelo menos, provoca reações moralmente duvidosas".

Com um espaço infinito para que os candidatos se comuniquem com os eleitores, ede relação interativa, a campanha eleitoral pode se libertar da propaganda de slogans ejingles repetitivos, que, para muitos políticos, resume-se à mera divulgação de nome enúmero eleitoral. Não se trata apenas de aumentar o teor informativo da propaganda política, como contraponto ao alto teor estratégico de uma campanha eleitoral. A interatividade pode ainda resgatar o caráter dialógico da discussão pública de plataforma,planos e programas de atuação do candidato, no lugar da mera exibição pública, da cena política controlada pela comunicação de massa.
Diante deste cenário de possibilidades, porém, deve-se lembrar o alerta de Luis Felipe Miguel, com relação à internet, de que "a tecnologia não representa uma solução" e pode ser apropriada de muitas e diferentes formas. Como outros, ele dá o exemplo de que Bertolt Brecht via potencialidades emancipatórias no rádio, que foi usado de forma a reforçar a passividade e o estatuto do consumidor de informação. A mesma ressalva às possibilidades da internet é feita por Manuel Castells, ao observar empiricamente que, em geral, há "escassíssimos exemplos de prática interativa cotidiana do sistema político com os cidadãos". Ele lamenta que os governos, as administrações e os partidos políticos confundiram a internet com um quadro de anúncios: "Em geral, limitam-se a expor dados: aqui está a nossa informação para que vocês fiquem sabendo o que fazemos, isso nos poupa trabalho e, se desejarem, podem nos dar a sua opinião. O que acontece é que não sabemos o que se passa com essa opinião."
No entanto, se os benefícios da propaganda eleitoral pela internet ainda não estão muito bem definidos, Manuel Castells já aponta como um fato irreversível a perda de privacidade do cidadão, pois "qualquer coisa que façamos na rede pode ser detectada eletronicamente". Castells relata que já existem empresas nos Estados Unidos que vendem, para uso em campanhas eleitorais, informações obtidas em bancos de dados comerciais com o perfil de personalidade dos eleitores, estabelecendo tendências de voto potencial por região. A essa perda de privacidade soma-se a incapacidade dos governos de controlar a internet. Marcel Leonardi aponta como os principais problemas relacionados à tutela de direitos na rede a identificação e localização do responsável por ato ilícito cometido por meio eletrônico, a remoção ou bloqueio de acesso a conteúdo lesivo disponibilizado na rede, a quantificação do dano moral causado por sua divulgação, o ônus da prova nas questões técnicas inerentes ao funcionamento da rede e os limites do sistema jurídico e da jurisdição.

Feitas estas considerações, cabe então questionar como as instituições têm orientado a propaganda eleitoral pela internet, em relação à busca da ética da dimensão pública e ao cumprimento das possibilidades de utilização das ferramentas da rede, já que a realização dos potenciais da nova tecnologia vai depender parcialmente da criação e adaptação de leis para regulamentá-la.
Deve-se notar que a regulamentação da campanha eleitoral pela internet é hoje um processo em andamento, ainda sem leis e normas específicas consolidadas no Brasil ou mesmo em outros países com maior taxa de penetração da rede na sociedade, como os Estados Unidos e o Reino Unido. Neste sentido, convém observar que essa regulamentação começa no Brasil em um momento em que a maioria dos eleitores ainda não está conectada. Os brasileiros com acesso à internet, estimados pelo Ibope Mídia em 31% da população, ainda se restringem a uma minoria, concentrada nas grandes cidades e formada por pessoas de alta escolaridade. Segundo dados do mesmo instituto de pesquisa, entre a parcela de 10% mais ricos da população, 82% contam com acesso à rede. Já entre os 40% mais pobres entre os brasileiros, somente 10% têm acesso. A 17ª Pesquisa internet POP, realizada em abril de 2005 pelo Ibope/NetRatings, estima em 11,4 milhões os usuários residenciais ativos.

Com isso, o objetivo deste artigo é esclarecer como a legislação eleitoral, resoluções e julgados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) têm orientado a propaganda pela internet diante de suas possibilidades e riscos, em uma análise comparada com a regulamentação dos Estados Unidos e do Reino Unido sobre o tema. A comparação desses dois países com o Brasil se justifica pelo maior grau de desenvolvimento, utilização e penetração da rede de computadores na sociedade. A análise será desenvolvida especificamente a partir dos principais dispositivos de comunicação pela internet – sítios (sites), salas de bate-papo(chats), correio eletrônico (e-mail) e comunidades virtuais de relacionamentos (Orkut). A monografia não se propõe a analisar o conteúdo das campanhas eleitorais – embora determinados casos possam ser citados como exemplos para a regulamentação da propaganda eleitoral pela internet.
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