terça-feira, 6 de maio de 2008

Britto: "Vamos ter boas novidades"

Propaganda na internet


Um dos temas, seguramente, é o controle ou não da mídia eletrônica a partir dos blogs. Isso virá à tona. A propaganda eleitoral via internet, via e-mail, via blog vai aflorar. Outro tema que virá à tona é o da vida pregressa do candidato.

Fidelidade

A democracia é um processo de aperfeiçoamento. É um processo cumulativo de qualificação. A democracia é crescentemente superavitária, ela incorpora mais saldos à sua conta bancaria e aos seus estoques de boas novidades. Nesse crescendo democrático, nós estamos pugnando pela fidelidade do filiado ao seu partido, mas em um segundo momento, nós encontraremos mecanismos para impedir, ou pelo menos dificultar, o mandonismo partidário, a oligarquia endógena partidária. Nós vamos chegar a esse ponto. O aperfeiçoamento também vai passar por esses questionamentos das figuras dos donos dos partidos, porque nós temos recebido esse tipo de queixa e é procedente. Os filiados dizem: “Vocês nos cobram fidelidade. A fidelidade a um partido que tem dono dirigido por oligarcas, cesaristas, mandões, coronéis, de terno e gravata”. Eles estão certos. Nós vamos aperfeiçoar o processo para divulgar essa idéia e criar mecanismos de que o partido tenha um compromisso, deva respeito a si mesmo, deva fidelidade a si mesmo. A primeira fidelidade é a do partido para com o seu programa e para com o processo democrático. Nós vamos descobrir mecanismos viabilizadores dessa idéia. Nós vamos chegar, já estamos chegando nessa fase da cobrança da fidelidade dos partidos ao seu programa e ao processo democrático, e aí o mandonismo, o cesarismo partidário, vai ser questionado.

Quociente eleitoral

Eu já tenho dito que o dogma é para ser convertido em problema. É para ser problematizado, analisado e estudado como todo problema. Se depois de problematizado, o dogma resiste a uma crítica consistente, devida, isenta, ele deve ser mantido e reverenciado de joelhos e mãos postas. Agora, se ele não resiste, é preciso ter coragem para estilhaçá-lo. O quociente eleitoral é um dogma. Ele resiste a uma análise na perspectiva, por exemplo, do eleitor soberano? A Constituição diz que o eleitor é soberano. O poder mais alto é o poder soberano. A soberania é o que está acima de tudo e acima de todos. O eleitor soberano, então, diz: “Eu vou votar em fulano de tal, filiado a tal partido” ou “eu não vou votar em nenhum candidato nominalmente, eu vou votar por sigla, nesse partido”. Aí vem a lei e diz que o partido que não conseguir o quociente eleitoral não se aproveita nem dos votos que lhe foram dados, nem seus candidatos se aproveitam dos votos que foram dados e partidos de candidatos que não tiveram votos se apropriam desses votos. O eleitor volta e diz: “Meu voto foi para onde? Não foi para meu candidato? Não, não foi. Não foi para o meu partido? Não, não foi. Espera aí, foi para um candidato de um partido que eu não votei”. Que soberania é essa?

Veja, não estou antecipando o meu voto, estou fazendo um questionamento. Eu já confirmei o que os sábios do direito já diziam desde sempre: quando o seu senso de justiça material reage a uma praxe, a uma tradição, preste atenção, ali está ou pode estar a grande oportunidade para se dar um salto quântico, de qualidade, para quem tiver coragem de problematizar os dogmas. Vão me dizer que o sistema é proporcional. Mas a gente não pode trabalhar com o sistema proporcional de outro modo, que não signifique uma apropriação indébita de votos do eleitor soberano? Isso é uma apropriação indébita. Não é possível bolar um sistema de representação proporcional impeditivo dessa apropriação. Nós temos um ranço autoritário que se disfarça, que se encobre, que se mascara. A quem serve o quociente eleitoral como cláusula de exclusão partidária, cláusula de barreira? Aos grandes partidos. É um mecanismo autoritário e elitista.

Ativismo judicial

Esse ativismo judiciário se dá no campo interpretativo, não é no campo legislativo. Eu nunca concordei com essa idéia de que nós estamos usurpando função. Não estamos. Esse nosso ativismo judiciário no campo interpretativo, ou seja, extraindo de velhos dispositivos jurídicos angulações normativas novas, isso faz parte do processo interpretativo, isso ajuda o Congresso Nacional a meditar sobre os temas e a ocupar o espaço que é dele. Qual é o espaço dele? É o legiferante. Então na medida em que a gente se antecipa no plano interpretativo apontando aspectos, visualidades, propriedades normativas, novas de velhos dispositivos, o Congresso se sente motivado.

É o novo olhar, o olhar democrático sobre o dispositivo, que pode desencadear uma reação normativa nova. Quem afirma isso no nível microscópico ou subatômico é a física quântica, que faz revelações extraordinárias. Ela diz que as coisas estão em movimento, que dialogam, se encontram, se interpenetram e se modificam. O observador, o cientista, consciente, atento, desencadeia reações no objeto, que acontece na realidade do observador e, em certa medida, do jeito que o observador quer. Se transportar isso para a área jurídica, o operador jurídico atento, consciente, tocado de pureza democrática, ética, projeta um novo olhar sobre o dispositivo que, por sua vez, revela uma angulação normativa imperceptível até então. É o que nós temos feito. Vamos ter boas novidades.

Ministro Carlos Britto, novo Presidente do TSE, em entrevista à Revista Consultor Jurídico

2 comentários:

Cláudio Ladeira de Oliveira disse...

"é o que nós temos feito" foi mesmo de uma humildade constrangedora...

Mauro Noleto disse...

Caro Ladeira, novidades à vista no TSE que, ao que parece, quer ser mais do que árbitro do processo político, quer "purificá-lo". Que interessante isso, né. O argumento da pureza, que já foi a pedra angular do formalismo, agora utilizado como metáfora para a intervenção judicial na reforma dos costumes políticos.

Não discordo de suas observações sobre os riscos e impropriedades dessa nova faceta da ação dos juízes no regime democrático, los hay. Mas, insisto, esse é o arranjo novo, a acomodação das instituições na democracia política, a representativa. Acontece que os representantes do povo e o próprio povo vivem sob o regime do Direito. E esse tem mudado muito. Observe o trânsito cultural de nosso Direito, antes legalista e agora sob a influência vertical da jurisprudência, dos precedentes, das súmulas vinculantes, da repercussão geral... É a nossa common law, meu caro. Os tribunais estão ativos.

Enquanto isso, os parlamentares se perdem em cpi's e contra-cpi's.

Não tenho mais a pretensão de oferecer receitas procedimentais para o Direito. Basta-me a legimitidade de propósitos e a liberdade como baliza da ação social.

Forte abraço.

PS. Maracanaço na faixa do bi!

PS 2.Parabéns pelo carioca!