quinta-feira, 29 de maio de 2008

A nova reforma política do TSE: vida pregressa

O deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, disse nesta terça-feira (27/5) ao ministro Carlos Britto, presidente do Tribunal Superior Eleitoral, que poderá apresentar nos próximos dias uma Consulta sobre a validade da candidatura de políticos com vida pregressa incompatível com a moralidade.

Em audiência com os membros da CCJ, Britto afirmou que uma Consulta neste momento será bem-vinda, porque fará o TSE se manifestar sobre ela antes do início do processo eleitoral. “É chegada a hora de partidos ou parlamentares tomarem a iniciativa de fazer uma Consulta ao TSE”, disse. Ele acrescentou, porém, que a decisão será tomada sem pressa.

Os parlamentares disseram que estão preocupados com a eventual demora de decisão do TSE. Eles afirmam que os políticos que tiverem o registro da candidatura negado pelo tribunal regional ficarão fora da disputa, ao menos até o julgamento de um recurso pelo TSE. Por isso ficarão em desvantagem em relação aos adversários.

Cunha informou que vai sugerir aos integrantes da comissão que a Consulta seja formalizada pelo conjunto de deputados que a integram. Ele acredita que, dessa forma, o questionamento terá maior peso político.

Em 2006, Britto ficou vencido no julgamento que discutiu a candidatura de Eurico Miranda, réu em vários processos criminais. Na ocasião, o TSE decidiu que mais vale a presunção de inocência do que a moralidade pública.

Revista Consultor Jurídico, 29 de maio de 2008.

Comentário meu: Quem disse que o Legislativo se incomoda com a atuação criativa da jurisprudência eleitoral? Pelo que entendi, os parlamentares, que não conseguem votar a reforma política, descobriram que é mais fácil fazê-la por consulta ao TSE, afinal foi assim com a verticalização, a fidelidade partidária e, agora, com a inelegibilidade daqueles com a "ficha suja" na Justiça, ou seja, com vida pregressa desabonadora. Isso é que é harmonia entre os Poderes.

5 comentários:

Cláudio Ladeira de Oliveira disse...

Mauro,
Você pensa mesmo que os parlamentares possuem uma proposta de reforma política mas que como não conseguem aprova-la então é bem vinda a reforma criada pelo TSE? Interpretei corretamente tua afirmação?
Mas veja se não é plausível supor o seguinte: não há, no congresso, nenhuma maioria para aprovar alguma das diversas propostas existentes (voto em lista fechada, voto distrital, voto aberto etc) e sendo assim nenhuma reforma é aprovada. A consequencia é que qualquer "reforma" aprovada pelo TSE corresponde a uma posição política minoritária que no entanto é transformada em lei simplesmente porque um grupo de funcionários não eleitos (uma maioria de ministros de tribunais superiores) prefere tal proposta.
Particularmente eu acho que não existe "uma" reforma política pronta, esperando para ser aprovada, seja pelo legislativo seja pelo judiciário. O que há é tribunais legislando, surfando na onda do "clamor popular" incitado pela grande mídia.
Outra coisa: você não acha natural que os partidos e parlamentares, na razoável suposição de que a legislação judicial continuará, dada a dificuldade atual de combatê-la, ao menos consultem o tribunal sobre qual será a próxima novidade? Isso não significa que aceitem a legislação judicial como legítima.
PS. Parabéns por ontem lá em Buenos Aires, teu tricolor já está nas finais. Na condição de secador inveterado tenho que admitir que foi bonito. Como diria o Nelson Rodrigues, ontem vocês entraram em campo com um jogador importantíssimo, um tal de "vergonha na cara". Esse mesmo sujeitinho nos fez uma falta dos diabos no jogo contra o América...
Abração

Mauro Noleto disse...

Veja bem, meu amigo, há uma ironia nesse meu comentário. O que eu quis insinuar é mesmo a desmoralização do Poder Legislativo como tal. Os caras são vítimas de sua própria inércia e absoluta falta de maturidade política para separar a luta ideológica da política legislativa. Vivem de escândalos e denúncias, ou, na melhor das hipóteses, de votar medidas provisórias do Executivo - que também legisla muito mais do que o Legislativo e o Judiciário juntos, não é?

Sei que você é um observador atento aqui d'APonte e, por isso, sabe que minha posição em relação ao ativismo judicial é mais realista do que laudatória. Acho que isso é uma característica de nossa vintenária democracia, o que não significa que seja necessária e sempre benéfica. Por exemplo, o caso da competência consultiva do TSE. Bastaria revogar o art. 23, XII, do Código Eleitoral de 65, para amenizar esse ímpeto legiferante do TSE. Mas não, o que fazem os nobres representantes do povo? Provocam o TSE, levantam a bola para que mais uma vez se faça "reforma política", às pressas, em cima da hora, sem debate nacional, e mediante consulta, que não faz coisa julgada, e que, portanto, não tem o poder de vincular nem o próprio Tribunal. Resultado: continua a insegurança.

O que me parece é que estamos a substituir o casuísmo legislativo, que sempre vigorou em matéria eleitoral, por outro, judicial. Não acho que esse novo casuísmo seja melhor do que o velho, ambos apenas evitam o enfrentamento dos reais problemas da representação política: "presidencialismo de coalizão", legendas de aluguel, financiamento privado de campanhas eleitorais, coligações em eleições proporcionais para driblar o quociente eleitoral, sub-desenvolvimento partidário... Essa lista é muito longa.

O que quis dizer, portanto, foi que parece mais confortável aos parlamentares evitar discutir diretamente os problemas, como esse da vida pregressa, mesmo que isso represente uma capitis diminutio de seu próprio poder. Por que digo isso? Ora, assim como no caso da verticalização e da fidelidade, nada há de expresso na Constituição ou nas leis brasileiras que autorize essa nova hipótese de inelegibilidade. O TSE, no entanto, não tá nem aí.

Forte abraço.

PS. Obrigado pela torcida, ainda que contrária.

Cláudio Ladeira de Oliveira disse...

Mauro,
De fato, não percebi a ironia. Você tem razão no essencial. Aliás, é um caso clássico de problema de ação coletiva. Para muitos parlamentares individualmente sobra a expectativa de aprovar sua tese no tribunal, uma vitória que dificilmente conseguiria aprovar no congresso, dada a ausência de alguma maioria; mas para o parlamento como um todo esta é a pior opção, pois lhe retira poder.
Porém há algo em que insisto (esta é a tese do Wanderley Guilherme dos Santos): a tese da "inércia paralmentar" é equivocada. Se não há uma maioria parlamentar favorável, p. ex., à inserção da fidelidade partidária no atual sistema eleitoral, então isso simplesmente não deve ser feito. Em outras palavras: há uma maioria parlamentar favorável à sua não inserção. E ponto. Onde está a inércia? O problema do argumento da "inércia parlamentar" é ele pode ser usado sempre que uma tese, majoritária no interior de tribunais como o TSE ou o STF, é minoritária no parlamento. Aprovar judicialmente uma oção política minoritária, derrotando assim a opção majoritária, é ofensa e não concretização da democracia.
Sobre isso acho válidas as palavras iniciais da min. Ellen Gracie no voto sobre as células tronco: "equivocam-se aqueles que enxergaram nesta Corte a figura de um árbitro responsável por proclamar a vitória incontestável dessa ou daquela corrente científica, filosófica, religiosa, moral ou ética sobre todas as demais (...) Não há, por certo, uma definição constitucional do momento inicial da vida humana e não é papel desta Suprema Corte estabelecer conceitos que já não estejam explícita ou implicitamente plasmados na Constituição Federal. Não somos uma Academia de Ciências." Acho que este posicionamento deveria ser aplicado em mais casos.

E domingo tem Fla x Flu...

Abração
Cláudio

Mauro Noleto disse...

Foi bom o exemplo das células tronco para mostrar que nem sempre a maioria parlamentar perde no Supremo. Agora, admitir que a agenda da democracia constitucional brasileira seja realizada apenas pelo Parlamento é, com todo respeito, desconhecer a própria legitimidade do Supremo enquanto Poder. Que seja estranho, perturbador, assustador, enfadonho, aguardar a decisão de 11 pessoas, para saber que rumo tomarará a vida da sociedade brasileira, tudo bem. Mas já é hora de a Ciência Política fazer a interdisciplinaridade na direção do direito constitucional e começar a aceitar melhor essa situação. Levar em conta, por exemplo, que o Supremo acabou de ativar a eficácia do mandado de injunção e, quem sabe, não resgata também a ação direta de inconstitucionalidade por omissão. Seria isso uma ditadura constitucional? A coisa não é assim tão fácil, não é. Foi afinal opção do Legislador Constituinte originário atribuir poderes ao Tribunal no controle de constitucionalidade. A representatividade eleitoral não é mais o único senhor a bordo da democracia nacional, pelo menos depois de 1988. Claro, essa transferência de legitimidade precisa de respaldo social, o que não significa a necessidade de eleger os Ministros, mas pelo menos deveria abrir o debate para o problema da composição das Cortes, o acompanhamento dos mandatos, a transparência dos procedimentos judiciais, isto é, algo que permita o controle da cidadania sobre a ação judicial.

Quanto ao Congresso, repito, não se lhe deve tirar mais poderes do que ele já não tem.

Boa sorte com o "expressinho" tricolor.

Cláudio Ladeira de Oliveira disse...

Ô Mauro, dá uma olhada neste post:

http://civitates.blogspot.com/2008/05/marco-aurlio-mello-e-o-ativismo.html

Eis aí um exemplo de ativismo judicial concretizador da democracia sobre o qual todos estaríamos de acordo.
Abração