segunda-feira, 12 de maio de 2008

Um diálogo entre juristas

A primeira vez que ouvi falar em "teoria tópica" foi nas aulas de professor Gilmar Mendes, ainda na graduação da UnB, início dos noventa. Foi quando li o precioso "Tópica e Jurisprudência" de Theodor Viehweg. Consegui a edição de 1979, traduzida por Tércio Sampaio Ferraz Jr., que havia sido aluno do autor, entre 1965 e 68. Não dei continuidade a seu estudo na época, infelizmente, pois acho que me valeria bastante na investigação que passei a fazer sobre subjetividade jurídica.

Voltei à tópica por indicação de um amigo, o professor Rodrigo Kaufman, que me emprestou outro texto instigante, o livro de Juan Antonio Garcia Amado, "Teorias de la Tópica Jurídica". Edição de 1988, Civitas, Madrid. Ali pude perceber melhor o alcance da teoria para explicar certos movimentos da jurisprudência constitucional e eleitoral brasileira.

Apliquei o modelo na análise da jurisprudência do TSE quando me especializei em Direito Eleitoral na UnB. Boa parte dos apoios bibliográficos de minha pesquisa vieram da internet. Uma das descobertas foi a Revista Telemática de Filosofia del Derecho.

Foi lá que encontrei o texto que dá título a este post: "un diálogo entre juristas", de Jerónimo Corral Genicio. Um belo exercício dialético, bem ao estilo clássico.

Faz tempo tenho pensado em traduzí-lo, embora a leitura no original não seja tão complicada. Mas, creio estarmos vivendo uma verdadeira mudança em nossa cultura jurídica. O Judiciário é o novo ator do palco da formação do Direito brasileiro. E a teoria tópica se dedica a examinar o momento que antecede a formação da vontade decisória, a busca e o manejo das premissas decisórias. O que ela pretende mostrar é que essas premissas não são necessariamente as regras do sistema normativo, mas valores, opções éticas, princípios, topoi, uma lógica material que é muito mais presa aos fatos, aos problemas concretos, do que aos conceitos dogmáticos do sistema normativo. Algo muito parecido, a meu ver, com o que estamos a vivenciar.

Resolvi começar aqui n'APonte a tradução. Ei-la:

- Apresento-me. Sou um jurista convencido do brilho e do acerto do método axiomático-dedutivo.

- Eu sou o jurista tópico. Aqui conversaremos sobre a necessidade da argumentação racional no Direito e de substituir a lógica formal impessoal por uma lógica do razoável, para uma disciplina que, definitivamente, se baseia na intersubjetividade humana e na justiça que há de guiar toda alteridade. Do que se trata - e quanto a isto nenhum operador jurídico há de discordar -, é que a nossa legislação soluciona os problemas da convivência social, e por isso cabe a nós, os teóricos, elaborar uma técnica que oriente para a solução mais justa, mais razoável e mais de acordo com a ordem positiva, de tais problemas.

- Bem, se vamos refletir sobre nossos respectivos métodos, estaremos fazendo metodologia, estás de acordo?

- Estou.

- E como é possível que uma teoria do método esqueça o conceitual e se converta em tópica? Pois afirmo que não há método sem sistema.

- É que a sistemática própria do Direito é ser intrinsecamente problemática. Ou, se preferes, o problema vive enraizado no sistema, de maneira latente, e é a vida, com seus interesses, valores, necessidades, quem o torna manifesto.

- Vejo que falas conjuntamente de problema e de sistema. Não são irreconciliáveis os métodos de pensamento sistemático e problemático? Porque, no primeiro, as respostas se encontram por derivações lógicas dos elementos do sistema, rechaçando aquelas questões que não se ajustam a ele, enquanto que, no segundo, o centro de gravidade gira em torno do enunciado, relativizando a importância do sistema, que pode ser capaz ou não de oferecer uma solução.

- Nós tópicos não somos tão ingênuos, ou tão devotos do sentimento jurídico dos juízes como que para dar a eles uma liberdade assistemática na aplicação dos topoi. Já advertia Cícero que a disertatio se compõe de uma fase inventiva e outra formativa do juízo. À primeira corresponde a tópica, a ars inveniendi, ou de busca de premissas; e a segunda é dialética e corresponde à ars iudicandi.

(continua...)

Nenhum comentário: