segunda-feira, 1 de setembro de 2008

A era do grampo II

Por Luis Nassif

Veja continua na escalada para provar a existência de um estado policial no país. Nova capa anunciando as provas dos grampos nas autoridades e no país (clique aqui). A única prova apresentada é um suposto grampo, supostamente entregue à reportagem por um suposto agente da Abin, no qual o Ministro Gilmar Mendes, do STF, conversa com o senador Demóstenes Torres, da CPI da Pedofilia.

O autor da reportagem é Policarpo Filho – autor de um conjunto enorme de reportagens, baseadas em grampos, arapongas e aparato policial, a maioria das quais nunca se confirmou – caso Chico Lopes, no governo passado; dólares de Cuba, no atual governo. A propósito desse estilo de jornalismo, sugiro a leitura dos capítulos “O araponga e o repórter” e “O método Veja de jornalismo”.

Certa vez o economista Paulo Singer declarou que nem ele – homem acima de qualquer suspeita – resistiria a 24 horas de grampo, com seleção de frases soltas. Mas Gilmar resiste bravamente e sai engrandecido com a divulgação do grampo. No diálogo selecionado se vê um juiz na defesa estrita da legalidade, contra abusos de juízes de primeira instância e procuradores. E um senador que defende a CPI contra juízes de primeira instância que pretendem proteger pedófilos. Quer cena mais legitimadora da ação do STF e das CPIs? É um caso extraordinário de grampo a favor dos grampeados. Não há nenhuma indicação da fonte. O autor da reportagem foi autor de inúmeros furos que jamais de confirmaram. Mas a reportagem é taxativa: Paulo Lacerda, diretor da Abin, está no epicentro do escândalo. Além de coordenar secretamente uma operação policial que nem o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa (à dir.), conhecia, a agência que ele dirige grampeou ilegalmente os telefones do presidente do Supremo Tribunal Federal, de ministros do governo Lula e de parlamentares.

A reportagem recorre até ao ex-Ministro José Dirceu – que transforma em vítima de ataques noturnos da Polícia Federal, depois de fustigá-lo implacavelmente por edições e edições. Não faz muito tempo, um para-jornalista da revista divulgou a agenda de trabalho do Dirceu. Que tal Diogo Mainardi – que se vangloria de não respeitar o off – informar quem foi a fonte que lhe passou documentos pessoais de Dirceu? Ajudaria a combater o estado policial no país. Pouco tempo atrás, temas como direitos individuais estavam longe das preocupações da revista. Paulo Lacerda era o herói celebrado em uma capa memorável: “Os Intocáveis”

Vamos a algumas conclusões desse jogo: é possível que a Abin e a PF tenham grampeado autoridades ilegalmente. Como é possível que não o tenham feito. Mas as reportagens da Veja não comprovam nada. Apenas indicam que, subitamente, a revista passou de beneficiária ampla de divulgação de grampos ilegais a crítica acerba dessa atitude. Essa mudança traz mais informações do que todos os supostos furos dados pela revista sobre o "estado policial".

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