quarta-feira, 14 de março de 2007

O Maranhão do Sul está no mapa

Quem já se deu o trabalho de ler ou pelo menos ver este blog até pelo menos um terço da front page deve ter notado o mapa do Maranhão do Sul à esquerda. Pois, é, hoje a CCJ do Senado aprovou a realização de plebiscito para consultar a população do Estado do Maranhão sobre o desmembramento.


O Maranhão infelizmente está no mapa do Brasil como um dos mais atrasados estados. Tem índices sofríveis no quesito desenvolvimento humano. E, desde sempre, a classe política governa no, e para, seu litoral, de costas para o interior, o sertão maranhense.

São Luis é uma cidade linda, barroca, caribenha, negra. Mas, o sotaque maraNHense de lá não é usado no sul. O bumba-boi e o reggae de lá competem com o forró, o brega e a música sertaneja em franca desvantagem. O sul do Maranhão é uma terra ainda em busca de identidade, mas decididamente tem pouco a ver com o norte litorâneo.

O sul do estado tem como cidade-pólo, Imperatriz. Banhada pelo Tocantins, de um lado e cortada pela Belém-Brasília, de outro, é uma cidade reconhecida por um passado violento de guerra entre famílias que disputavam o comando do crime de pistolagem, homicídios encomendados. Eu cresci (década de setenta) com as histórias de pistoleiros, prefeitos assassinados, o crime do Padre Josimo, que aconteceu num início de tarde a 10 metros do escritório de meu pai, na praça de Fátima... São feridas que precisam cicatrizar para que esse povo comece a pensar em identidade geo-política.

A cidade hoje já melhorou muito, mas amarga com a falta de investimentos e com os desacertos e absurdos das administrações públicas locais, além, do descaso com que São Luis trata dos seus problemas.

O sul, no entanto, é uma região rica. Sua população é pobre, mas não miserável. Tem uma classe política própria. Conflitos e problemas sociais (luta pela terra, questão indígena, corrupção, violência criminal crescente, o problema ambiental da bacia do Tocantins que pode virar uma escada d'água para gerar energia, a expansão da soja...). Mas, mesmo em seus períodos mais fracos, a cidade de Imperatriz, desde os anos 80 (quando todo o país estava em recessão, o ouro de Serra Pelada e o Ferro de Carajás injetaram dinheiro no comércio local e na agropecuária), tem mantido o posto de centro dessa região esquecida pelos primos do norte e pouco conhecida pelo restante do país.

O desejo de criar o Estado do Maranhão do Sul é antigo, mas ganhou corpo com a criação do vizinho Tocantins, que duas décadas atrás era o apêndice esquecido pelo Goiás tradicional, pecuarista, de história colonial próspera, e hoje oferece oportunidades e desenvolvimento (econômico, cultural, político) para sua população. Quem conhece, quem, como eu, é de lá, sabe que é legítima a vontade popular de procurar o mesmo caminho de emancipação.

A foto que ilustra este post é de Pedra Caída, um santuário ecológico que fica na exuberante Chapada das Mesas, o mais novo parque nacional brasileiro. A sede do Parque é Carolina, cidade centenária, berço cultural e econômico da região até a explosão da vizinha Imperatriz, que saiu de 30 mil para 300 mil habitantes nos últimos 30 anos.
Se o projeto for aprovado no Congresso, o povo vai se manifestar por plebiscito, a imprensa nacional deverá reclamar nos editoriais do gasto público federal a ser empregado na criação do novo estado, a federação brasileira voltará à pauta, já dá pra imaginar o tom das análises "sulistas".
A propósito, lembrei-me de um texto do repóter da Globo, Luiz Carlos Azenha, publicado em seu blog na época da campanha eleitoral do ano passado. É o Brasil:
"Houve um tempo em que o Rio de Janeiro, nossa gloriosa ex-Capital, era considerado a caixa de ressonância do Brasil.Nada de importante acontecia no País sem antes passar por Ipanema ou Leblon. Mais recentemente, pelo Jardim Botânico.
A supremacia econômica paulista pôs fim à hegemonia carioca e o território que nos deu a Bossa Nova foi loteado entre o Comando Vermelho e políticos provincianos.
O que se desfaz agora é a hegemonia midiática do eixo Rio-São Paulo - no linguajar dos acadêmicos da USP.Não precisei consultar um deles para descobrir. Consultei meu guru político, o Cebolinha, editor de imagens da TV Globo de São Paulo. Ele teve paciência de Jó para acessar, na internet, os sites dos jornais mais importantes das cidades médias brasileiras. Fez uma descoberta simples: eles não tem dado tanto espaço e destaque à crise do dossiê quanto a mídia dos pretensos centros de irradiação da opinião brasileira, situados no eixo Rio-São Paulo.
É uma faceta bastante simplória de um fenômeno que deveria aparecer no radar de nossos analistas, se eles se dessem ao trabalho de desviar o olhar, um pouco que fosse, para além do próprio umbigo.
Lembram do sonho de Juscelino, de interiorizar o Brasil com a construção de Brasília? Pois é, ainda que nem todos tenham notado, aconteceu. Pedro Bial, em reportagem para o Jornal Nacional, esteve lá, na cidade que surgiu do nada por conta do agronegócio.
Aconteceu, amigos: dá para atravessar o Brasil de Santa Maria a Imperatriz, sem passar pela costa."
Vem aí o Maranhão do Sul.

2 comentários:

Anônimo disse...

interessantíssima a matéria professor. Tomara que venha para melhor este novo estado.
abraço

Mauro Noleto disse...

Obrigado pelo comentário, Gabriel. Mesmo suspeito para falar - corri o risco de ser bairrista - não resisti depois da notícia de que o plebiscito poderá ser realizado. Aliás, esse é um assunto que interessa ao curso, pois o plebiscito é uma das manifestações do direito de sufrágio. Espero encontrá-lo mais vezes por aqui.

Abraço forte.